sexta-feira, 6 de julho de 2007

MATERIALISMO HISTÓRICO: PENSANDO A CATEGORIA DE HISTÓRIA





, por Walter G. R. Lippold






“O que é história? Conversa fiada, segundo Henry Ford. Um pesadelo pensavava Joyce. Falsidades, rosnou Nietzsche. A grande dor, replica Frederic Jameson. Uma cha-te-a-ção (sic), dizem nossos filhos, que usam a palavra história para dar a idéia do rejeitado, do acabado, do morto. Por que defender essa ‘coisa’ chamada história?” BRYAN PALMER


Este artigo não é um lampejo individual: foi produzido com a ajuda dos debates entre colegas e o Professor Triviños nas ricas tardes e manhãs de quarta-feira. Foi influenciado pela minha prática de educador popular e historiador, se é que as duas coisas podem ser dissociadas. Agradeço a todos que de certa forma irão se reconhecer neste breve texto. Aos que fazem a história. Aos construtores das Portas de Tebas e da Pirâmide de Quéops. Aos cozinheiros que alimentaram tantos soldados famintos. Ao operário em construção. Aos que foram esquecidos. Os famélicos da Terra. Não “A ou B & Cia.”. Não a retórica vazia, mas a materialização da nossa praxis., de nossa realidade e de nosso porvir. Por tudo isso, convido-os a adentrar em um debate necessário atualmente: O que é história?

Ao citarmos a categoria de história, muitas pessoas automaticamente fazem uma analogia com os grandes feitos, as batalhas, e os grandes vultos da humanidade. O historiador é representado como um erudito socado em meio de documentos empoeirados, segundo esta concepção de história, ele deve fazer falar os fatos por si mesmos, ou seja, toda interpretação é puro subjetivismo, não é considerada científica. Esta concepção chama-se positivismo e sua influência na historiografia brasileira foi poderosa, ou melhor, continua sendo. Mas acreditamos que a história não é um turbilhão de nomes, datas e fatos, um álbum de antiguidades pétreas.

Usualmente, quando os historiadores, falamos em história, com “h” minúsculo, nos referimos ao processo histórico em si, quando escrevemos História, com “H” maiúsculo, nos referimos à disciplina História, o estudo desse processo. Atualmente, dentro do quadro teórico dos representantes da pós-modernidade, chega-se ao outro extremo do positivismo: nega-se que é possível compreender o processo histórico, aliás, nem se fala em processo, mas sim em descontinuidade absoluta, em fragmentação, em textualidade discursiva. A história é incognoscível, tudo é contingente, como diz Paul Veyne: “a história é um romance real”. A História, dentro desta concepção, acaba tornando-se um mero “contar estórias”, . Há uma forte tendência em afirmar que a história é um mero encantamento discursivo conjurado do presente, não existe ciência histórica, pois não existe nenhuma objetividade no ato de escrever História. Não há lógica, nem ligações necessárias, reina o relativismo cego: “A teoria em moda postula uma contemporaneidade quase desencarnada e fragmentada como ambiente da história, como acontecendo aparentemente divorciada da causalidade – uma série de ‘presentes perpétuos’.” (PALMER, 1999, p.74).

Ao condenar as metanarrativas pós-iluministas, os pós-modernistas escondem sob o mesmo manto teorias que diferem muito entre si, “construindo”, como já afirmou Mészáros, uma reductio ad absurdum, uma caricatura do marxismo para poder criticá-lo como uma “narrativa de subordinação”, deixando de lado o salto-ruptura efetivado no processo de desenvolvimento da teoria marxista, alcunhando este de ser reducionista e economicista. A defesa do materialismo histórico, de suas categorias, destacando a história e a classe social, faz-se necessária diante da apologética a-histórica – repetida ad nauseam - do “fim da luta de classes”, “fim das ideologias”, e finalmente, “fim da história”.

Este “fim da história” anunciado aos quatros cantos do mundo por Fukuyama, é na verdade, a naturalização e eternização ideológica da ordem de reprodução metabólica do capital, que teve um impulso poderoso, após o esfacelamento da “ameaça” soviética, é uma leitura vulgar da “síntese final” hegeliana, que no século XIX, era, para Hegel, o Estado Prussiano daquela época. É claro que Fukuyama é uma entre as diversas faces dos defensores da pós-modernidade, talvez a mais exagerada. Mas o aspecto que mais aproxima estas teorias é que:

[...] O pós-estruturalismo/pós-modernismo considera a história como a criação de um ou mais autores, uma inovação mágica do passado para servir ao conteúdo discursivo do presente. Assim, o passado só pode ser textualmente criado a partir dos imperativos de um exemplo presente.(PALMER, 1999, P.77).

Para a hegemonia teórica atual o materialismo histórico é uma teleologia mística, um reducionismo que coloca a riqueza e a diferença do caos histórico dentro do Leito de Procusto do economicismo mecaniscista. Será que leram o mesmo Marx que escreveu O 18 Brumário de Luis Bonaparte, que, junto com Engels, desenvolveu a concepção materialista de história em A Ideologia Alemã? Será que resolveram inventar uma caricatura borrada para poder assim menosprezar o materialismo histórico e suas categorias como peças dignas de um museu?

Adentremos em alguns pressupostos básicos para a compreensão da concepção materialista de História, na tentativa de solucionar as questões formuladas anteriormente. Em primeiro lugar devemos explicitar um problema fundamental: o da dialética do ser social e da consciência social. Para o materialismo histórico, o ser social é a origem da consciência social, ou seja

A produção das idéias, representações, da consciência está a princípio diretamente entrelaçada com a atividade material e o intercambio material dos homens, liguagem da vida real.[...] o ser dos homens é o seu processo real de vida. (MARX; ENGELS, 1981, p.29)

Ou seja, segundo Marx e Engels (1981, p.29): “Os homens são os produtores das suas representações, idéias, etc., e precisamente os homens condicionados pelo modo de produção da sua vida material, pelo intercâmbio material e o seu desenvolvimento posterior na estrutura social e política. ” Assim, as idéias, a moral, a religião, as ideologias, não possuem um história autônoma, elas estão sempre interligadas com o ser social, que as gerou. Mas isto não quer dizer que a consciência social não influencia o ser social. É por isso, que sem compreender a categoria de práxis, não se pode explicar a concepção materialista de história, já que é mediado pela práxis que os seres humanos fazem sua história, é através da práxis que o ser social e a consciência social encontram sua identidade temporária, a práxis objetiva o subjetivo e subjetiva o objetivo, une sujeito e objeto e transforma ambos.

Engels (1977, p.31) afirma “[...]que embora o modo material de existência seja o primum agens (agente primordial, causa primeira), isso não exclui as esferas ideológicas de reagirem por sua vez sobre ele, ainda que com um efeito secundário[...]”. E numa carta a Joseph Bloch, Engels (1977, p.34) explicita melhor aspectos da teoria do materialismo histórico:

[...]Segundo a concepção materialista da história, o elemento determinante da história é, em última instância, a produção e a reprodução da vida real. Nem Marx, nem eu dissemos outra coisa a não ser isso. Portanto, se alguém distorce esta afirmação para dizer que o elemento econômico é o único determinante, transforma-a numa frase sem sentido, abstrata e absurda. A situação econômica é a base, mas os diversos elementos da superestrutura [...] exercem igualmente sua ação sobre o curso das lutas históricas e, em muitos casos, determinam de maneira preponderante sua forma. Há ação e reação de todos esses fatores, no seio dos quais o movimento econômico acaba por se impor como uma necessidade através da infinita multidão de acidentes[...]Se assim não fosse, a aplicação da teoria a qualquer período histórico determinado seria, mais fácil do que a resolução de uma simples equação de primeiro grau”.

E mais adiante, na mesma carta, Engels exerce o importante exercício da autocrítica, coisa esquecida por muitos teóricos e políticos atuais, nestes tempos onde reinam o narcisismo intelectual e o egocentrismo individualista.

Marx e eu temos em parte a culpa pelo fato de que, às vezes, os jovens escritores [os primeiros “marxistas”] atribuam ao aspecto econômico maior importância do que a devida. Tivemos que enfatizar esse princípio fundamental frente a nossos adversários, que o negavam, e nem sempre tivemos tempo, lugar e oportunidade para fazer justiça aos outros elementos que participam da ação recíproca.

E continuando, em outra carta, Engels (1977, p.41) critica a todos mecanicistas, que não compreendem que causas e efeitos se transformam umas nas outras e estão essencialmente ligadas:

O que falta a todos estes senhores é a dialética. Apenas vêem causas ali, efeitos aqui. Que isto é uma abstração vazia, que no mundo real estas antíteses polares metafísicas só se dão em épocas de crise e que todo o grande curso das coisas se produz sob a forma de ação e reação de forças sem dúvida bastantes desiguais – ainda que o movimento econômico seja de longe a força mais poderosa, primordial e decisiva -, que aqui nada existe de absoluto e que tudo é relativo, isso é coisa que eles não vêem; para eles, Hegel não existiu.[...]

Todo este debate é importante para que possamos compreender a metáfora da base material e da superestrutura, para que não cairmos no reducionismo vulgar, maquiado de marxismo.
O materialismo histórico estuda o desenvolvimento humano que tem como origem a realidade material da sociedade em que vivem ou viveram; é a ciência social do marxismo. Como salientaram Marx e Engels em seu célebre Manifesto Comunista de 1848, a história da humanidade, desde o surgimento da propriedade privada, tem sido a história das lutas de classe, dos modos como o ser humano se organiza para reproduzir sua existência material.
Segundo Marx (1997, p.21) “Os homens fazem sua história, mas não a fazem como querem, não fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado.” Esta importante passagem de O 18 Brumário de Luis Bonaparte, é citada tantas vezes mecanicamente, que não se capta que nela reside o salto-ruptura que empreendeu Marx sobre a teorias que colocavam o homem como produto passivo das circunstâncias e sobre aquelas que negavam a objetividade da realidade histórica, caindo no idealismo de que um indivíduo pode moldar sua vida ao bel prazer. Os produtos do homem, tornaram-se hostis a humanidade, o mercado, a divisão do trabalho, o dinheiro, o capital, a mercadoria, todos criados pelos homens, tornaram a humanidade subjugada a poderes que parecem ser autônomos, não escolhemos viver sob a brutal exploração capitalista, mas estamos aqui, e nÃo podemos fugir dessa realidade, é sobre ela que devemos trabalhar, é sobre ela que muitos lutaram e outros lutarão por um realidade nova, o reino da liberdade, segundo Marx o verdadeiro início da história humana, onde a desumanização da maioria da população não seja o pressuposto para o enriquecimento de meia dúzia de burgueses. É por isso que Marx considera que vivemos atualmente a pré-história da humanidade, pois estamos mergulhados no reino da necessidade, subjugados pela necessidade imperiosa das leis do mercado, que devem ser internalizadas através de um complexo processo de reprodução ideológica necessário à reprodução dos circuitos do capital.

Alguns teóricos, antes de Marx, tentaram compreender a história sob as lentes do materialismo, mas muitos deles como Helvétius, que apesar de acreditar que as circunstâncias que rodeiam o ser humano determinam sua existência, afirmava que os grandes homens podiam modificar as opiniões errôneas, ignorantes que regiam a realidade social, caindo no idealismo. “Holbach e Helvetius, materialistas na sua concepção de natureza, eram idealistas no que se refere à História[...]os materialistas daquele tempo acreditavam que a opinião governa o mundo[...]” (PLEKHANOV, 2005, p.24). Um dos precursores da concepção marxista, segundo Ki-Zerbo (1982, p.752) foi Ibn Khaldun (1332-1406), norte-africano muçulmano que

[...]embora reconhecendo a Alá um império eminente sobre os destinos humanos, é o fundador da História como ciência, fundamentada em provas confirmadas pela razão.[...]para ele, o objetivo dessa ciência não é apenas a espuma superficial dos acontecimentos: “Qual é a vantagem de relatar os nomes das mulheres de um antigo soberano, ou a inscrição gravada em seu anel?” Ele estuda, sobretudo, os modos de produção e de vida, as relações sociais, em suma, a civilização (al-Umrān al-Badawī) e nas cidades (al-Umrān al Hadarī). Portanto, há uma passagem incessante e alternada do dominium de um ao da outra forma de civilização, sem que esse ritmo seja cíclico, pois se reproduz, a cada vez, em um nível superior, para dar origem a uma espécie de progressão em espiral. Afirmando que “as diferenças nos costumes e nas instituições dos diversos povos dependem da maneira como cada um deles provê à sua subsistência”, Ibn Khaldun formulava, com clareza e alguns séculos de antecedência, uma das proposições fundamentais do materialismo histórico de Karl Marx.

Antes de Ibn Khaldum, , Heródoto de Halicarnasso – que viveu na Grécia do século V a.C.. - foi o primeiro a usar o termo história, pois necessitava compreender as causas do conflito entre gregos e persas e assim pesquisou os costumes, a cultura, para posteriormente narrá-la, por isso foi considerado o “pai” da História. Já Tucídides, - historiador do século V, mas posterior a Heródoto - pesquisou a Guerra do Peloponeso e ajudou na consolidação do estudo da história, superou Heródoto. Antes deles podemos citar a contribuição dos griots africanos que deixaram sua marca indelével em todos os descendentes da Diáspora Negra, onde a oralidade é fundamental. Os griots eram historiadores-menestréis, até os dias de hoje, em países como Mali, eles ainda se fazem presente, mas sua influência é muito poderosa, principalmente no Brasil, se materializa em forma de cocos de emboladas, maracatus, sambas, raps e funks, que contam as histórias da periferia, uma verdadeira contra-História, ou melhor, um História contra-hegemômica.
. Os povos sempre valorizaram sua história, mas muitas vezes o mythos escondia o logos, considerava-se que apenas reis e grandes generais faziam a história, que as massas eram passivas, eram condenadas ao limbo histórico, ao esquecimento. Assim, como a ideologia dominante é a da classe que detém o poder material na sociedade, a concepção de história reinante, é a história dos vencedores, dos colonizadores, do “fardo do homem branco” na África, da mission civilisatrice européia, da burguesia maravilhada com seus próprios feitos.

Também é necessário explicitar a concepção de tempo histórico para o materialismo histórico, pois não podemos transportar o mecanicismo positivista que considera o tempo linear, uma teleologia do progresso humano. Para alguns pensadores gregos, como os pitagóricos, o tempo era circular, este momento em que estou digitando o presente texto, irá se repetir daqui 7 séculos, o mesmo momento, a mesma situação. É com o cristianismo que o tempo é concebido como linearidade, como avanço do Pecado Original, da queda do homem, até o soar das trombetas do apocalipse, há um avanço inexorável até este futuro anunciado profeticamente. Maquiavel, no século XVI, retomou a idéia de tempo circular, ao defender que da selvageria e da barbárie, os homens evoluem para o Estado sob o poder do príncipe e posteriormente chegamos à república. Mas a república possui contradições indissolúveis, entre os Grandes – os poderosos e ricos – e o povo, a corrupção é inerente à república, necessariamente ela irá desabar devido a estas rachaduras: voltamos ao estado inicial da selvageria e da barbárie. É claro que esta teoria foi retirada dos estudos de Maquiavel sobre a queda de Roma, e talvez por isso ele defendia a todo custo a manutenção do poder, pois quando mais firme o poder do príncipe, mais demorado ia ser o processo de retorno ao estado original.

Para o materialismo histórico, o processo de desenvolvimento da história é um movimento ascendente, mas espiralado, ou seja, que não avança linearmente , há retrocessos e paradas, continuidades e descontinuidades que se chocam e se interpenetram no movimento dialético da superação. Devemos combater certo “marxistas”que transpõe a linearidade positivista para o marxismo, a história não é uma linha reta ascendente de modos de produção, um esquema mecânico que passa longe do materialismo histórico. A história também não pode ser considerada produto do desenvolvimento da tecnologia, onde a dialética das forças produtivas e das relações de produção, é suplantada pelo determinismo tecnológico. Neste debate, é imprescindível, considerarmos uma importante categoria do materialismo histórico: o modo de produção.

No atual modo de produção processam-se as relações de classe, a oposição antagônica entre a classe capitalista e a dos trabalhadores. O modo de produção é uma unidade entre um certo nível de forças produtivas e de historicamente determinadas relações de produção. É através dessas relações de produção que a classe detentora dos meios de produção, explora a mercadoria força de trabalho, única mercadoria capaz de criar valor, é através de relações entre seres humanos que o capital se origina e se reproduz:

[...] o capital não é coisa, mas determinada relação social de produção, pertencente a uma formação histórica particular da sociedade, e essa relação se configura numa coisa e lhe dá caráter social específico. O capital não é a soma dos meios de produção materiais e produzidos. O capital são os meios de produção convertidos em capital, os quais em si não são capital como o ouro ou a prata em si, tampouco são moeda. São meios de produção monopolizados por determinada parte da sociedade, os produtos e condições de atividade da força de trabalho viva e, em virtude dessa oposição, se personificam no capital. [...](MARX,1981, p. 936).

Esse trecho ajuda-nos a pensar que não podemos considerar o materialismo histórico como uma teoria da teleologia da tecnologia. A crítica da economia política efetivada por Marx demonstra isso. Alguns marxistas acabaram por professar uma fé cega numa suposta neutralidade das forças produtivas, colocando-as como ativas perante as relações de produção. O socialismo seria um fruto do avanço inexorável da tecnologia, muitas vezes esquecendo-se que o ser humano é a principal força produtiva através do dispêndio de seu trabalho, através da sua práxis.

O que informa a perspectiva sobre a tecnologia que estamos criticando é a concepção de neutralidade das forças produtivas em relação às relações de produção, concepção esta que podemos definir a partir da idéia de um hipotético desenvolvimento autônomo das forças produtivas frente às relações de produção, sendo que esse desenvolvimento seria um aprimoramento contínuo das técnicas de produção, as quais deveriam valer para qualquer formação social, fosse ela pré-capitalista, capitalista ou socialista.” (ROMERO, 2005, p.21)

Mas é através de duas contradições fundamentais que o a história se desenvolve: a entre as forças produtivas e as relações de produção, que deve ser entendida dentro da dialética da quantidade e qualidade; entre as classes apropriadoras e as produtoras.

Também nos perguntamos se existe uma História Universal, já que muitas vezes, “História Geral” nos manuais escolares significa “História da Europa”. A história não é a priori universal, foi o capital que a tornou um processo que interligou todos os povos do mundo, nunca um modo de produção foi tão totalizante como o capitalista. É a partir desse pressuposto, que o marximo defende a luta mundial dos produtores, pois somente sob a égide do internacionalismo proletário, será possível a superação do atual modo de reprodução sócio-metabólico.

Quando ao uso ideológico da História, Chesneaux (1995, p.29) afirma que:

As classes dirigentes e o poder de Estado freqüentemente apelam ao passado de modo explícito: a tradição, aí incluídos os seus componentes específicos, a continuidade e a história são invocadas como fundamentos do princípio de sua dominação.

Assim voltamos a uma das duas concepções rapidamente expostas no começo desse artigo: o pós-modernismo. A pós-modernidade ao negar a história, acaba por se tornar apologética da eternização do modus operandi do capital. Ao negar o velho, inventa um novo deslocado do movimento histórico real. O movimento dialético da história é um processo onde se correlacionam elementos da descontinuidade e da continuidade, onde não há espaço para uma metafísica negação absoluta do velho, já que a superação, a síntese, carrega em si elementos de continuidade, agora vinculados com o novo. Um exemplo disso pode ser buscado na figura de Nietzsche – segundo Meszáros, um “homem para todas as estações” – que é um dos “velhos” cultuados pelos pós-modernistas. O que está em questão aqui é que os pós-modernistas também – de certo modo – defendem velhas posições ( o irracionalismo niilista e pessimista nietzscheano), articulando-as para novas necessidades. Ao fazerem isso admitem que sua descontinuidade “absoluta” está impregnada de elementos do velho, explicitam as contradições de um “meta-discurso” ligado a uma visão derrotista de uma “velha” esquerda que se travestiu de nova diante do espelho sedutor de um capitalismo que promete o deleite consumista das modas passageiras a todas as “minorias” que quiserem se integrar. Conjuramos por fim um espectro de um passado longínquo com o singelo intuito de finalizar nossos comentários sobre o artigo de Palmer, o espectro de Hegel, que brilhantemente brindou-nos com essas palavras na sua Filosofia do Direito: “É tão absurdo imaginar que uma filosofia possa transcender seu mundo contemporâneo, quanto imaginar que um indivíduo possa ultrapassar sua própria época, saltar sobre o canal de Rhodes”. Façamos das palavras de Esopo – citadas por Marx no O Dezoito Brumário de Luis Bonaparte - nosso apelo final aos pós-modernistas: Hic Rhodus, hic salta!



REFERÊNCIAS:

CHESNEAUX, Jean. Devemos fazer tábula rasa do passado? . São Paulo: Editora Ática, 1995.

KI-ZERBO, Joseph (coord.)História Geral da África: I. Metodologia e pré-história da África. São Paulo: Ática; UNESCO, 1982.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Cartas Filosóficas e outros Escritos. São Paulo: Grijalbo, 1977.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. 1º Capítulo. Lisboa: Edições Avante, 1981.

MARX, Carl. O 18 Brumário e cartas a Kugelmann. 6 Ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1997.

PALMER, Bryan. Velhas posições/novas necessidades: história, classe e metanarrativa marxista. WOOD, Ellen; FOSTER, John (ORGs). Em Defesa da História: Marxismo e Pós-modernismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999.

PLEKHANOV, G.V. Da filosofia da História. In. PLEKHANOV, G.V. O Papel do Indivíduo na História. São Paulo: Expressão Popular, 2005.
ROMERO, Daniel. Marx e a Técnica. Um estudo dos manuscritos de 1861-1863. São Paulo: Expressão Popular, 2005.

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  • A montanha é algo mais que uma imensa estepe verde - Omar Cabezas
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  • EZLN – Passos de uma rebeldia - Emilio Gennari
  • Imagens da revolução – documentos políticos das organizações clandestinas de esquerda dos anos 1961-1971; Daniel Aarão Reis Filho e Jair Ferreira de Sá
  • O Diário do Che na Bolívia
  • PODER E CONTRAPODER NA AMÉRICA LATINA Autor: FLORESTAN FERNANDES
  • Rebelde – testemunho de um combatente - Fernando Vecino Alegret

ZZ- Estudar Sempre /GEOGRAFIA EM MOVIMENTO

  • Abordagens e concepções de território - Marcos Aurélio Saquet
  • Campesinato e territórios em disputa - Eliane Tomiasi Paulino, João Edmilson Fabrini (organizadores)
  • Cidade e Campo - relações e contradições entre urbano e rural - Maria Encarnação Beltrão Sposito e Arthur Magon Whitacker (orgs)
  • Cidades Médias - produção do espaço urbano e regional - Eliseu Savério Sposito, M. Encarnação Beltrão Sposito, Oscar Sobarzo (orgs)
  • Cidades Médias: espaços em transição - Maria Encarnação Beltrão Spósito (org.)
  • Geografia Agrária - teoria e poder - Bernardo Mançano Fernandes, Marta Inez Medeiros Marques, Júlio César Suzuki (orgs.)
  • Geomorfologia - aplicações e metodologias - João Osvaldo Rodrigues Nunes e Paulo César Rocha
  • Indústria, ordenamento do território e transportes - a contribuição de André Fischer. Organizadores: Olga Lúcia Castreghini de Freitas Firkowski e Eliseu Savério Spósito
  • Questões territoriais na América Latina - Amalia Inés Geraiges de Lemos, Mónica Arroyo e María Laura Silveira