sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

O nascimento do PSUV na Venezuela

Escrito por José Reinaldo Carvalho e Altamiro Borges
17-Jan-2008

O dia 12 de janeiro entrará para a história da Venezuela. Nesta data, no simbólico Quartel San Carlos – onde já estiveram encarcerados vários heróis deste sofrido povo, como o líder negro José Leonardo, que liderou a revolta dos escravos contra os colonizadores espanhóis, e o próprio comandante Hugo Chávez, quando encabeçou a rebelião militar de 1992, e que hoje sedia um majestoso centro de cultura -, ocorreu o congresso fundacional do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSVU). O evento, que contou com a participação de 1.676 delegados eleitos em todo país, foi assistido por mais de 20 delegações estrangeiras. Do Brasil, PCdoB, PT, PCB e MST se fizeram representar e participaram de intensas e ricas atividades.

Conforme explicou Jorge Rodrigues, ex-vice presidente do país, coordenador do processo congressual e presidente provisório do novo partido, o PSUV surgiu como necessidade de dar maior organicidade aos milhões de venezuelanos que se identificam com a revolução bolivariana. Antes disso, os “chavistas” não contavam com um instrumento partidário próprio, mas apenas com uma legenda eleitoral, o Movimento Quinta República (MVR), nascido às vésperas de surpreendente vitória de Hugo Chávez nas eleições do final de 1998. “Realizamos uma revolução sem partido, mas agora iniciamos o trabalho de parto de um partido socialista e revolucionário”, explicou Rodrigues à atenta delegação estrangeira. Bem humorado e didático, ele fez uma “breve resenha” sobre o acelerado e sui generis processo de construção do PSUV.

Experiência complexa e original

“A revolução bolivariana tem pressa, essa é uma de suas marcas. Logo após expressiva vitória de Chávez nas eleições de dezembro de 2006, com 63% dos votos, o comandante fez um discurso sobre a urgência da construção de um partido forte, que represente todos os venezuelanos que apóiam o socialismo. Em apenas seis semanas, 5.722 milhões se filiaram ao novo partido, cerca de 36% dos eleitores do país. A meta era filiar 3 milhões, mas ela foi superada de forma impressionante. A partir daí iniciou-se o trabalho de estruturação do partido, com a construção dos núcleos, os batalhões socialistas, com no máximo 300 filiados. Foram criados 14.363 batalhões no país, reunindo pessoas que se conhecem, que são vizinhos, que apóiam a revolução bolivariana, mas que nunca tinham se organizado para discutir política”.

Segundo informou, “os batalhões socialistas realizam assembléias semanais, todos os sábados, quase que religiosamente. Em 29 de setembro, eles reuniram mais de 1,5 milhão de aspirantes a militantes do PSUV e elegeram um porta-voz, um suplente e cinco coordenadores de comissões (ideológica, propaganda, logística, defesa territorial e trabalho social). Eles são porta-vozes, devem expressar os anseios dos filiados, e não representantes afastados da base. Hoje temos mais de 100 mil integrantes nestas comissões, que atuam de forma organizada e são a vanguarda da construção de um partido altamente democrático. Em 20 de outubro, as assembléias elegeram os 1.676 delegados ao nosso congresso fundacional”.

O próprio Rodrigues admite que a “tarefa de construir um partido de quadros e de massas é complexa e apresenta inúmeras dificuldades”, mas ele está otimista com “o início do trabalho de parto”. A partir do congresso fundacional, os aspirantes a militante do partido discutirão durante dois meses os documentos partidários. “Definirão as bases programáticas, os estatutos e as tarefas políticas do PSUV. O objetivo é erguer um partido forte, o maior do país, com muita ternura e tolerância, mas também com muita firmeza. Os inimigos da revolução são poderosos e não descansam. O referendo da reforma constitucional mostrou que não podemos vacilar. A nossa revolução é pacífica, democrática, mas ela também é armada e não vai sucumbir diante de qualquer agressão. Sem um partido socialista forte, a revolução não avançará”.

“Revolução não depende de um homem”

O otimismo de Rodrigues ficou expresso no ato de abertura do congresso fundacional, que foi carregado de emoção, ao ritmo de canções revolucionárias. Coube ao presidente Hugo Chávez o principal discurso da noite. Em tom de brincadeira, ele disse que “será uma fala curta”, todos riram, e o discurso durou mais de três horas, acompanhado silenciosa e atentamente pelos presentes. Foi uma aula de política e ousadia. Após elogiar a realização do evento no Quartel San Carlos, “o presídio dos revolucionários”, e fazer uma menção carinhosa aos militantes do Partido Comunista da Venezuela (PCV) “torturados e assassinados neste cárcere”, Chávez apresentou algumas propostas para a construção do PSVU.

Com base em citações de Fidel Castro, Che Guevara e Antonio Gramsci, ele defendeu que o partido tenha uma ética revolucionária e seja formado por “trabalhadores dedicados, exemplos de pessoas honestas com uma vida limpa”. Ele insistiu também na necessidade do funcionamento coletivo e democrático, que evite personalismos e carreirismos. “Do partido depende o futuro da revolução. Ela não pode depender de um homem, de uma cúpula ou de uma vanguarda esclarecida. Precisa contar com milhões. Do contrário, ela ficará vulnerável”. Em tom autocrítico, ele admitiu que a ausência deste instrumento político é a principal debilidade da revolução bolivariana. Após citar várias conquistas políticas, econômicas e sociais, Chávez afirmou: “Conquistamos importantes avanços, mas não podemos negar nossos erros, limitações e falhas”.

Lições da derrota no referendo

Entre outras idéias, Chávez defendeu que o partido invista na formação do militante. “Sem conhecimento, sem estudo, a revolução não avançará. Só o conhecimento gera consciência”. Propôs ainda que o PSUV priorize as bases e valorize a militância, atuando de forma “radicalmente democrática”. “Não queremos novas oligarquias. O partido deve fortalecer os valores revolucionários, não pode aceitar corrupto... Deve ser uma escola forjadora de consciências e vontades para subverter a ordem capitalista... A consciência é o único motor que pode mover a vontade mais férrea”. Defendeu que o partido atue no curso das lutas políticas – “ vocês agora são atores políticos” – e tenha como perspectiva o socialismo. “Falaram que o socialismo morreu e que o marxismo era o diabo. Muitos até abandonaram o socialismo, traíram, com exceção de Cuba de Fidel Castro. Mas o socialismo do século 21 é o nosso maior desafio”. Propôs ainda uma ativa política internacionalista, que resulte “na união das forças de esquerda da América Latina”.

Num dos momentos mais ricos da sua exposição, Chávez analisou a dura derrota no referendo da reforma constitucional, realizado em dezembro. Numa autocrítica profunda e madura, afirmou com todas as letras que foi o principal responsável pela primeira derrota após nove anos de vitórias consecutivas. “Eu assumo minhas responsabilidades. Errei no momento estratégico do referendo. Não era a melhor hora, o povo não estava convencido das mudanças propostas”. Referindo-se novamente de forma elogiosa ao PCV e ao Partido Pátria para Todos (PPT), reconheceu que foi sectário no trato com estas organizações, “inclusive fazendo bromas” (ironias), e disse que era imperioso valorizar as alianças. “Sem alianças, a revolução não avança, ensinou Lênin”. Bastante aplaudido, afirmou que “é necessário declarar guerra ao sectarismo” e propôs o retorno do diálogo “com o PCV, PPT, as camadas médias e setores da burguesia nacional”.

“Uh, ah, Chávez no se va”

Para ele, o PSUV deve encarar o que chamou da “batalha dos três erres. Revisão, retificação e reimpulso revolucionário”. Quanto à reeleição presidencial, Chávez provocou os presentes: “Eu perdi o referendo e a partir de 2 de fevereiro de 2013 já não estarei mais no Palácio Miraflores”. A reação foi imediata: “Uh, ah, Chávez no se va”. Vários delegados gritaram que iniciarão uma campanha de coleta de assinaturas em defesa da reeleição, mas Chávez solicitou cuidado com a idéia para não se errar novamente no momento oportuno. “A nossa próxima batalha é a eleição de outubro de 2008. Não podemos deixar a direita ocupar postos importantes. Isto colocaria em risco nosso projeto bolivariano, socialista... Não é tempo de acelerar artificialmente. É tempo de consolidar”. Pela terceira vez, Chávez citou o PCV e o PPT e pregou a formação de um Pólo Patriótico, sem sectarismos, no que foi bastante aplaudido.

Além destes dois eventos, as delegações estrangeiras ainda participaram de um jantar com o ministro de Relações Exteriores da Venezuela, Nicolas Maduro, e a presidente da Assembléia Nacional, deputada Cilia Flores, e de uma reunião de troca de experiências com o primeiro vice-presidente da República, o deputado Roberto Hernandes Rodrigues. Nos relatos dos dirigentes de esquerda da Bolívia, Equador, Uruguai, Chile, México, entre outros, ficou patente que há uma mudança de ventos na América Latina mais favorável às lutas dos povos. Mas, como ressaltaram os latino-americanos e, principalmente, os representantes da França, Itália, Alemanha e de outros países da Europa, o momento ainda é de acúmulo de forças. A direita tenta retomar a ofensiva e atua com muita agressividade. Chamou atenção que todos, sem exceção, enfatizaram o papel nocivo da mídia hegemônica, o principal partido da direita no mundo.

José Reinaldo Carvalho é secretário de relações internacionais do PCdoB; Altamiro Borges é secretário de comunicação. Ambos representaram a direção nacional do PCdoB em Caracas a convite do PSUV.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

O Taichi Vermelho






, por Runildo Pinto

porto alegre 04012008










Enxergo

semáforos e sinais acústicos,

multidões

a ressoarem-indiferentes,

sirenes e sol a zênite;


A velha chinesa

sentada à calçada

abana seu leque.....



O fluido quente,

gasoso

faz do momento acrobata

um elegíaco

em sopro de flauta que dista


Um corpo alongado

amparando a obra

sem apetite

e sentido à visão


A chinesa calada

geme, maledicente.

Conserva-se

no leque chinês


Moldada e cozida

no asfalto e o sólido limitado,

salva-se à mão dolorida

em movimento,

único equilíbrio.


quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Aproximações a Julio Cortazar

Wellington Ricardo Fioruci


“No hago diferencia entre la realidad y lo fantástico. Para mí, lo fantástico procede siempre de lo cotidiano.”

Julio Cortazar

Julio CortázarAutor e obra: um diálogo profuso

Julio Cortázar, escritor portenho, nacionalizado francês, foi um dos grandes nomes da literatura contemporânea. Unia o atrevimento literário e a aventura estética com o compromisso político em favor dos povos do terceiro mundo, num desejo de subverter não só a linguagem, mas sim de nos fazer descobrir universos que o homem é incapaz de ver.

O seu exílio na França, após a chegada de Perón, foi responsável pela produção de duas obras importantes: Los reyes (1949) e Bestiario (1951). Nelas, Cortázar encontrou dois caminhos seguros: o relato como meio de expressão e a linguagem ou “jogo da forma”. Em seguida, juntamente com Borges, será o maestro do conto, do relato e da narração paradoxal. Em Las Armas secretas (1959) está um de seus contos mais conhecidos, Las Babas del diablo, um relato no qual o escritor e o fotógrafo se enfrentam com a natureza mentirosa de seu ofício: a fiel reprodução é impossível para o homem. Em 1964 publica Final del juego e Todos los fuegos el fuego em 1966, considerada por alguns sua obra de maior êxito.

Segundo Cortázar, o homem, instintivamente, não se contenta com o lado aparente das coisas e busca, então, o outro lado. “O outro lado” sob o prisma cortazariano é um mundo de criatividade não estruturada, como a poesia de Lorca ou a música de Johnny em El perseguidor, outro fabuloso trabalho do autor. Pode-se dizer grosso modo que Cortázar possuía o segredo literário de conceber uma segunda realidade. Segunda realidade na qual uma galeria em Paris conduz a uma galeria comercial em Buenos Aires com naturalidade; na qual as casas são tomadas pacientemente, cômodo após cômodo, por forças desconhecidas que aterrorizam seus habitantes. Se se deseja “conectar” coisas, por exemplo, tudo o que se tem que fazer, como em Rayuela, uma das grandes manifestações da modernidade hispano-americana, é unir duas sacadas de um manicômio por meio de uma grande tábua.

Cortázar escreveu um maravilhoso conto sobre o maior engarrafamento do mundo na auto-estrada Paris-Marselha. O escreveu na mesma forma em que Colombo descreve o mar Caribe. Uns dias antes de sua morte, a auto-estrada que une a França à Itália através dos Alpes sofreu um bloqueio total, obra, sem dúvida, dos cronópios em homenagem ao escritor.

Em Historias de Cronopios y de Famas, Cortázar divide os leitores em dois grupos: os famas são os que se ajustam a regras fixas e vivem de uma forma convencional, ao passo que os cronopios vivem de forma espontânea e livre. Rayuela (1963), o mais grandioso romance deste escritor, foi escrita para estes. Neste romance quebra-cabeças se coloca em dúvida a literatura e sua relação com a realidade. O romance se divide em três partes: o lado de “lá”, o lado de “cá” e, por fim, os “outros lados”, e representa a desintegração de tudo o que constitui cultura e moralidade, demonstrando com seu texto fragmentado a convencionalidade do pensamento, da ação e inusitadamente da atividade literária. Rayuela é a história de um homem, chamado Oliveira, que deixa a herança e deixa a América por outra cidade, Paris, que para ele representa o ócio, a novidade, as férias, a cultura, já descobrindo na Europa que a história é uma viagem vã, o trânsito por um mundo que não conduz a nenhuma parte. Para Cortázar, as coisas sempre estão fora de seu lugar. Como em “La isla a mediodía”, desejamos o avião quando estamos em terra e a terra firme quando estamos voando.

No ritmo frenético de quase um livro por ano, Cortázar publicou em 1967 La vuelta al día en ochenta mundos, um livro insólito sobre a vida cotidiana de um escritor. Modelo para armar (1968), Libro de Manuel (1973) e assim sucessivamente até Nicaragua tan violentamente dulce, título que resume a posição do autor em relação a este país e que veio a público uns dias antes de sua morte. Cortázar é considerado por José Donoso como o autor que inicia o “boom” da literatura hispano-americana, ao qual se uniriam Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa, Carpentier e os demais contemporâneos.

Aproveitando a oportunidade que se nos afigura, seria interessante e por demais proveitoso abrir espaço para a discussão deste momento que se denominou o “boom” da narrativa hispano-americana, ocasião em que desponta uma notável escritura que passaria a tomar corpo até atingir seu ápice com a consecução dos prêmios literários e o conseqüente reconhecimento de sua importância pelo público mundial. Este parêntese se faz necessário visto que nosso escritor em observação, Julio Cortázar, se configura numa das mais importantes figuras deste período, pelo qual perpassa a produção literária do artista portenho da palavra.

Aspectos históricos da narrativa contemporânea hispano-americana

Embora Cortázar tenha feito parte deste momento histórico da literatura hispano-americana contemporânea, ou seja, o que permeia o alvorecer e a consagração do boom da narrativa, não foi ele o primeiro a se lançar nesta imbricada aventura literária. Este feito ficou a cargo de outro argentino, não menos notável, que certamente foi o pioneiro, o responsável pela revolução do conto na América hispânica, realizando este portentoso ideal com a exploração de mundos históricos ou mesmo míticos. Seu nome é Jorge Luis Borges, o famoso escritor que acabou sendo imortalizado ao ser fabulosamente transformado em personagem por Umberto Eco em O Nome da rosa.

Para explicar o chamado “boom” hispano-americano podemos arrolar várias causas que trabalharam em favor de sua concretização, causas estas que se associam na criação de uma novelística autenticamente nova. Ao lado da maturidade alcançada pelo conto, devemos ter em conta vários acontecimentos: a rebelião iniciada pelos vanguardistas dos anos 20 contra um conceito de realismo e de realidade por demais estreitos, ínfimos; a influência de Faulkner e o fluxo de consciência joyciana; a fantasia surrealista; o tratamento da memória e do tempo em Proust; o “nouveau-roman” francês; o crescimento das cidades, da Buenos Aires de Borges, inflada de tensões, de espanhóis, polacos, italianos e russos, que até ali haviam ido em busca da utopia perdida, e na qual também havia tertúlias, polêmicas literárias e revistas como Proa, Claridad, Prisma e Martín Fierro. Em outro plano, não menos primordiais, estão as tensões políticas, o impacto da revolução cubana com o discurso de Fidel Castro dirigido aos intelectuais, a ressonância dos meios de comunicação e o incremento dos círculos de leitores.

Nesta América hispânica, as literaturas nacionais não funcionam no mesmo sentido que as literaturas nacionais européias, articuladas em sistemas coerentes e estáveis. A maior parte da literatura atual destes países atravessa as fronteiras e, em muitos casos, em função das ditaduras, se produz no exílio - tal é o caso de Cortázar - principalmente na Espanha, de forma que os grupos, os estilos e as tendências literárias não coincidem com as divisões políticas e também geográficas.

Como já colocamos em destaque anteriormente, o conto, expoente desta narrativa que se agigantava, é posto em relevo por Borges, quem inicia seu ciclo com El jardín de los Senderos que se bifurcan (1942), obtendo seu clímax por assim dizer com Ficciones (1944) e El Aleph (1949). Nos anos 50 nos encontramos diante de uma década prodigiosa, na qual se revelam dentro deste gênero todos os grandes representantes da nova narrativa.

Com efeito, em 1951, aparecem os primeiros relatos do uruguaio Juan Carlos Onetti, Un Sueño realizado y otros cuentos. É neste limiar de uma nova narrativa que Cortázar publica então Bestiario e, junto com ele, Juan José Arreola lança seu Confabulario, enquanto o paraguaio Roa Bastos nos afronta com o espetáculo alucinante de seu país em El trueno de las hojas. Ao ponto de partida de todas as inovações com Borges, já citado, sucede-se em 1953 outro fabuloso relato El llano en llamas, do mexicano Juan Rulfo, seguido por outro mexicano, também revelação, Carlos Fuentes, com seu Los días enmascarados. Pouco tempo depois, em 1955, o colombiano Gabriel García Márquez nos surpreende com o mundo alucinante de Macondo no conto La hojarasca. O cubano Alejo Carpentier publica Guerra del tiempo e o guatemalteco Miguel Angel Asturias um novo testemunho de seu país com Weekend en Guatemala. Já em 1958, o peruano Vargas Llosa se une a esta narrativa com Los jefes, romance que também compartilha produtos de sua experiência pessoal.

Em termos gerais, visando a ampliar um pouco mais esta comunicação, podemos afirmar que há um ponto em comum entre todas estas várias manifestações literárias, permitindo-nos visualizar um eixo que as une a um só núcleo temático. Este aspecto, contagiante em todos estes autores, se encontra em seu afã de renovação, o cultivo do nativismo, do relato mágico, do conto fantástico, psicológico, expressionista e comprometido, que preparará a década seguinte na qual aparecerão todas as obras importantes do “boom” hispano-americano. Enfim, pela importância deste período, bem como pela grandeza dos autores que nele publicam suas obras, pareceu-nos imprescindível traçar este breve quadro, de suma relevância para a compreensão da obra cortazariana.

Imagens num mesmo espelho

Ao falarmos sobre o escritor Julio Cortázar estamos, automaticamente, nos referindo não a uma entidade, mas sim a várias, que se complementam como um todo, unidas num mesmo plano. Assim se nos revela este excêntrico personagem: um único ser dotado de um caráter polimorfo, que se ramifica em espectros que ganham autonomia e mobilidade dentro de seus respectivos espaços míticos, simbólicos, atemporais, dando vida ao texto e abrindo espaço para múltiplas visões da mesma realidade, como se tudo passasse pelo crivo de um caleidoscópio.

Com efeito, observamos ao longo de sua produção literária uma linha perene e contínua que conduz os diferentes relatos de suas obras, ao final, a um confronto no mesmo espelho, mas que não necessariamente representa o final do ciclo, senão o seu novo começo. Num jogo constante de atração e repulsão, o autor consegue estabelecer um discurso que se reinventa e se auto-afirma na composição de inúmeras realidades, sendo estas, porém, faces de uma mesma moeda. Em termos de analogia, poderíamos imaginar a seguinte situação: as inúmeras leituras propiciadas pela obra-caleidoscópica seriam luzes incidindo em um mesmo cristal, que gera brilhos e imagens diversos ao ser observado de posições díspares, formando desenhos peculiares aos olhos dos diferentes observadores.

Não é uma tarefa simples penetrar no âmbito de seus textos sem que, antes disto, tenhamos que desfazer a névoa que se interpõe entre nossos olhos e o mundo que nos cerca, para que, então, livres desta sombra que nos prende ao plano aparente da realidade, possamos ingressar no universo mágico de “sua realidade”, ou seja, nada mais que a captação de um plano superior, onde se diluem as aparências para dar lugar às essências, como a metáfora e a alegoria, que conseguem exprimir com maior excelência o universo humano. Deste modo, suas obras nos apresentam um universo mais sensível, que desvenda o ser humano perdido em seu labirinto existencial, ou melhor, nos leva ao desvendamento de nós mesmos enquanto co-participantes deste mundo em transformação, que no final das contas não passa de uma mera criação de nossa arguta imaginação.

O presente escritor - podemos dizer sem medo de errar - é, portanto, aquele que explora incessantemente o mesmo tema, revisitando-o a cada novo passo, sempre envolto no mesmo texto que, a partir de sua apreensão pelo leitor, vai ganhando dimensões sui generis e também inexauríveis. Mas há que se dizer que tais dimensões não fogem ao mesmo plano que se constrói no confronto entre o “eu” e o “outro”, metáfora que desvela, encobrindo e descobrindo, o encontro da realidade verdadeira e definitiva por debaixo das máscaras; por um lado o toque fugaz nas essências e, por outro prisma não excludente, o reconhecimento de si mesmo mediante tão desviada e certeira via. No entanto, acrescente-se a isto o fato de que este encontro com o “outro”, seja quem for, é a metáfora do próprio processo literário e, por conseguinte, do próprio processo imaginativo.

Cortázar, assim como outros escritores contemporâneos como García Márquez e Borges, embora caminhe por diferentes espaços e trilhe rumos distintos no decorrer de seu processo de criação, acaba repetindo suas pegadas, pois todos seus textos se consubstanciam num texto maior e mais opulento, que reafirma todo o processo e se faz único mesmo diante da pluridiscursividade alcançada pelas páginas fecundas de suas produções. São, portanto, imagens num mesmo espelho, reflexos que transcendem as impressões desta realidade que não consegue se afirmar por si própria e que, portanto, se torna ínfima se comparada a potencialidade do discurso literário, este sim um mundo aparte.

Palavras finais

A título de resumo, podemos afirmar que existe uma rede entrecruzada de artifícios narrativos que se reiteram na produção dos textos, formando, então, um grande texto simbólico que acaba por representar em seus domínios alegóricos um verdadeiro arquétipo das relações humanas. Este microcosmo literário articulado por Cortázar se desenvolve ao longo de sua produção literária, sempre permeada pelo imaginário da narrativa contemporânea do “Boom” hispano-americano.

Absorvendo as idéias que fora buscar entre um emaranhado de textos os mais diversos, Cortázar as redimensiona e as aplica no conjunto de seus textos, sempre no intuito de mostrar a necessidade da busca pelo outro, do que ainda está por vir e por descobrir, cujo desejo está na essência do espírito humano. É a eterna busca pelo desvelamento de si mesmo, da resposta para o deciframento da condição humana, que pode estar no outro, em nós, ou ainda na relação de aproximamento entre ambos, mas que sem dúvida deve estar nas linhas prolíferas dos textos cortazarianos, cabendo ao leitor a tarefa de traduzir os códigos lingüísticos que o separam da resolução, deste achado simbólico. Contudo, aos olhos deste intraduzível escritor, o que importa nesta tarefa é a predominância do sentimento unitivo, fator inexorável ao universo de seus contos.

Seja por meio de enigmas, de interseções de níveis narrativos ou mesmo pela transponibilidade de barreiras espaço-temporais, o narrador, representante privilegiado do escritor no universo ficcional, sempre consegue abrir passagens atemporais e fantásticas que tornam viáveis o acesso “ao outro lado”, o desconhecido, ao qual o leitor pode interagir como num toque de mágica. Por meio das palavras elucidadoras de Ángel Rama (1978, p.170), que parecem encaixar-se perfeitamente em nosso comentário, concluímos que:

“Por sutil e inacessível que seja, a permanência fixa, obsessiva dessa atitude é a que nos permite reencontrá-lo tanto no primeiro texto quanto no último que escreveu. O que nos permite compreender por que sua arte está afastada de toda linearidade evolutiva e, em troca, traça círculos, retornos, espirais e constrói “personagens” que implicam os mesmos pontos recorrentes do desenho, situados sobre diferentes valores ou campos culturais e que foram transpostos analogicamente, pois o autor é uma vítima (prazerosa como um pecador impenitente) do demônio da analogia.”

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

O homem neoliberal: da redução das cabeças à mudança dos corpos









CULTURA

A suspensão atual das proibições esconde um verdadeiro projeto pós-nazista sustentado pelo capitalismo. Ao mesmo tempo em que quebra as regulamentações simbólicas, possibilita que a técnica avance sozinha até quebrar a humanidade

Dany-Robert Dufour

Dado que só há mais um conjunto de produtos que são trocados por seu estrito valor comercial, os homens devem livrar-se de todas as sobrecargas culturais e simbólicas

Em L’art de réduire les têtes1, eu havia tentado evidenciar a profunda reconfiguração das mentes realizada pelo mercado. A demonstração era relativamente simples: o mercado recusa qualquer consideração (moral, tradicional, transcendente, transcendental, cultural, ambiental…) que possa impedir a livre circulação da mercadoria no mundo. É por isso que o novo capitalismo tenta desmantelar qualquer valor simbólico unicamente em benefício do valor monetário neutro da mercadoria. Dado que não há mais nada senão um conjunto de produtos que são trocados por seu estrito valor comercial, os homens devem livrar-se de todas as sobrecargas culturais e simbólicas que, até há pouco tempo, garantiam suas trocas.

Tem-se um bom exemplo dessa dessimbolização produzida pela expansão do reino da mercadoria quando se examina o papel-moeda emitido em euro. Observa-se que estas notas perderam as efígies das grandes figuras da cultura que, de Pasteur a Pascal e de Descartes a Delacroix, indexavam, ainda ontem, as trocas monetárias sobre os valores culturais patrimoniais dos Estados-nação. Hoje, não há nada impresso nos euros além de pontes e portas ou janelas, exaltando uma fluidez desculturada. Pede-se aos homens que se curvem ao jogo da circulação infinita da mercadoria. Pode-se dizer, portanto, que a lei do mercado é destruir todas as formas de lei que representem uma pressão sobre a mercadoria.

Ao abolir qualquer valor comum, o mercado está em via de fabricar um outro “homem novo”, privado de sua faculdade de julgar (sem outro princípio que o do lucro máximo), levado a usufruir sem desejar (a única salvação possível encontra-se na mercadoria), formado em todas as flutuações identitárias (não há mais sujeito; existem apenas subjetivações temporárias, precárias) e aberto a quaisquer conexões comerciais. Estamos, aqui, diante de um aspecto muito particular da desregulamentação neoliberal que, infelizmente, ainda não é bem compreendida, mas que já produz efeitos consideráveis em todos os domínios, particularmente sobre o psiquismo humano. Um certo número de psiquiatras e de psicanalistas está fazendo o inventário dos novos sintomas decorrentes desta desregulamentação, como a depressão, as diversas dependências, as perturbações narcisistas, a extensão da perversão etc.

Desregulamentação simbólica

Está se fazendo o inventário dos novos sintomas decorrentes desta desregulamentação, como a depressão, as diversas dependências, as perturbações narcisistas, perversões

Esta desregulamentação de tipo novo provoca grandes confusões nos debates atuais. Ela é acompanhada de um cheiro libertário, baseado na proclamação da autonomia de cada um e numa extensão da tolerância em todos os campos sociais (dentre os quais o dos costumes), que tende a fazer acreditar que estamos em vias de viver um intenso período de libertação. Dado que o antigo patriarcado opressivo está em desvantagem, acredita-se que uma revolução sem precedentes estaria a caminho... esquecendo-se de que foi o próprio capitalismo que comandou esta “revolução” visando a facilitar a penetração da mercadoria nos domínios onde ela ainda não reinava – o dos costumes e o da cultura.

Karl Marx não se enganava quanto a essa face “revolucionária” do capitalismo: “A burguesia”, escrevia ele, “não pode existir sem provocar, constantemente, grandes mudanças nos instrumentos de produção, portanto nas relações de produção e, portanto, no conjunto das condições sociais. De modo contrário, a primeira condição de existência de todas as classes industriais anteriores era manter inalterado o antigo modo de produção. O que distingue a época burguesa de todas as precedentes é a incessante introdução de mudanças na produção, a desestabilização contínua de todas as instituições sociais, em resumo, a permanência da instabilidade e do movimento. Todas as relações sociais enferrujadas, com seu cortejo de idéias e de opiniões admitidas e veneradas, dissolvem-se; as que as substituem envelhecem antes mesmo de se esclerosarem. Tudo o que era sólido, bem definido, se desmancha no ar, tudo o que era sagrado se encontra profanado e, afinal, os homens são forçados a considerar com um olhar desiludido o lugar que ocupam na vida e suas relações recíprocas2.” Esta capacidade de transformar as relações sociais atingiu o ponto máximo através desse novo estado do capitalismo que é chamado às vezes, e com razão, de “anarco-capitalismo”.

Essa transformação funcionou tão bem que houve quem tentasse reter apenas o lado “libertário”, “jovem” e “conectado” da nova forma, empolgando-se, sem grandes dificuldades, com a revolução dos costumes que ela introduzia. A confusão é tal que quem não faz outra coisa senão seguir essa desregulamentação cultural e simbólica acredita-se muitíssimo revolucionário – penso na parte da esquerda conectada que se entusiasma com todas as “causas tendência”. Ora, é exatamente o que quer dizer o anarco-capitalismo que gosta, se não da “revolução”, pelo menos de todas as formas de desregulamentação culturais e simbólicas. Todos os spots publicitários mostram isto.

Perigos potenciais

Esta desregulamentação simbólica provoca grandes confusões nos debates atuais, pois é acompanhada de um cheiro libertário

Parece que as populações pressentem os consideráveis perigos potenciais que a civilização corre diante de tal desregulamentação simbólica. Mas o Mercado pode recuperar tudo em seu proveito: muitos grupos já estão agindo, vangloriando-se e vendendo morais de péssima qualidade. Ora, seria um erro crucial deixar o debate sobre os valores para os conservadores, sejam eles antigos ou “neo”. De fato, se se abandonar esse terreno, ele será, como nos Estados Unidos, ocupado por George W. Bush, pelos tele-evangelistas e seus supostos puritanos, ou, como na Europa, pelos populismos fascistizantes. Portanto, é urgente construir uma nova reflexão sobre os valores, sobre o sentido da vida em sociedade e sobre o bem comum destinado às populações confusamente alarmadas pelos estragos morais devidos à extensão infinita do reino da mercadoria. É claro que, se esse terreno não for cercado, essas populações serão tentadas a pender para o lado dos que o ocupam de forma tão barulhenta quanto indevida.

Entretanto, restringir o debate a esses aspectos culturais seria cometer um grande engano. Porque parece que essa reconfiguração das mentes não é senão a primeira fase de um mecanismo mais amplo. Para dizê-lo em poucas palavras, a “redução de cabeças” e a dessimbolização são apenas o prelúdio de uma outra redefinição em profundidade do homem, a qual, então, atingiria não só sua mente, mas também seu corpo.

Momento decisivo

É urgente construir uma nova reflexão sobre os valores, sobre o sentido da vida em sociedade e sobre o bem comum para populações alarmadas pelos estragos morais

Essa dessimbolização do mundo ocorre num momento decisivo da aventura humana: é a primeira vez na história do ser vivo que uma criatura chega a ler a escrita da qual ela é a expressão. Com tal seqüência, tornou-se possível um acontecimento incrível: o instante em que a criatura vai poder voltar à criação para se refazer. O instante em que a criatura vai interferir em sua criação e pôr-se como seu próprio criador. Chega, pois, o momento inconcebível em que uma espécie vai poder intervir em seu próprio devir substituindo as leis naturais da evolução.

Tudo acontece como se a recomendação humanista lançada no Renascimento por um de seus grandes pensadores, Pic de la Mirandole, tivesse sido ouvida além de todos os limites. Pic queria introduzir, de encontro às antigas formas de dominação absoluta pelo divino, um pouco de livre arbítrio humano. Deste modo, convocava o homem a “esculpir sua própria estátua3 ”. O apelo foi ouvido por toda a filosofia posterior, pois esta pode ser considerada como um desenvolvimento muito longo do tema do livre arbítrio humano, da construção do cogito cartesiano ao tema da morte de Deus em Nietzsche, passando pelo ideal crítico do Iluminismo.

Ora, o homem atual está em via de ultrapassar esse ideal dado que, se estiver efetivamente em via de “esculpir sua própria estátua”, esta bem poderia ser uma estátua viva, chamada a substituir a do próprio homem. Observemos, de passagem, que isso não seria nada menos que o fim da filosofia, que seria abrangida numa tal intenção de redefinição das bases materiais da humanidade. Sua realização suporia, de fato, a transformação irremediável de um empreendimento, incessantemente relançado desde a Antiguidade, de reforma do espírito (pela ascese, pela busca da autonomia, pela refundação do entendimento) num objetivo puramente tecnicista de modificação do corpo. Mas de que serviria ganhar um corpo novo se isto significasse perder o espírito?

Fukuyama e a "pós-humanidade"

Essa dessimbolização do mundo ocorre num momento decisivo da aventura humana: em que a criatura vai interferir em sua criação e pôr-se como seu próprio criador.

É mais importante ainda colocar a questão à medida que existe um programa difuso de fabricação de uma “pós-humanidade”. Tal programa é dissimulado, quase não se lhe dá publicidade. Não se deve assustar os homens; principalmente, eles não podem compreender que os fazem trabalhar na abolição da humanidade – isto é, em seu próprio desaparecimento. O mundo do ser vivo foi de tal forma cercado pelo capitalismo, a fim de nele desenvolver novos espaços para a mercadoria, que algumas de suas conseqüências possíveis sobre a própria humanidade acabaram atravessando o muro do silêncio. É assim que Francis Fukuyama – o arauto do neoliberalismo, que havia proclamado, depois da queda do muro de Berlin, o início do “fim da história” com o advento generalizado das democracias neoliberais – teve que se retrair e admitir que o triunfo do mercado não era o último episódio da história humana. Um outro se seguiria: a transformação biológica da humanidade4 . Mas este abrir de olhos não lhe foi senão a oportunidade de cair num novo erro de avaliação.

Francis Fukuyama quer acreditar que o neoliberalismo poderá preservar-nos dessa engrenagem fatal… quando é ele que nos leva diretamente a ela! Para ele, na verdade, a democracia de mercado seria um estado perfeito se não estivesse ameaçado pelo desenvolvimento de algumas técnicas: “Uma técnica suficientemente poderosa para remodelar o que somos pode bem ter conseqüências potencialmente ruins para a democracia liberal5 .” Evidentemente, é necessário convir quanto a isto: se não há mais homens, a democracia corre o risco de se esvaziar. Para evitar semelhante perigo, bastaria, segundo Fukuyama, que “os países regulassem politicamente o desenvolvimento e a utilização da técnica”. Piedosa intenção que não come pão e que lhe permite manter-se em silêncio a respeito do essencial: é o mercado que mantém o desenvolvimento infindável das tecno-ciências, as quais, não reguladas, conduzem diretamente para uma saída fora da humanidade.

Da pós modernidade à pós história

O empreendimento, relançado desde a Antiguidade, de reforma do espírito se transforma num objetivo puramente tecnicista de modificação do corpo

Este elo, no entanto, é claro: dado que o mercado implica o fim de qualquer forma de inibição simbólica (isto é, o fim da referência a qualquer valor transcendental ou moral em proveito unicamente do valor comercial), nada, caso se permaneça nesta lógica, poderá impedir que o homem se liberte de qualquer idéia que pretenda mantê-lo em seu lugar e que saia de sua condição ancestral tão logo tenha os meios para tal. Portanto, não é a ciência sozinha, como se diz com freqüência, e sim a ciência mais o efeito deletério do mercado sobre os valores transcendentais que estariam em condições de permitir a realização desse programa. É preciso, pois, se colocar a questão: existirá, em nossas democracias pós-modernas onde se pode dizer tudo, uma instância política para decidir se nós queremos ou não essa mutação? Nada é menos certo.

Ora, a ausência desse lugar tem um peso importante. Vê-se onde o programa de fabricação de uma pós-humanidade poderia levar: diretamente à entrada numa era de produção de indivíduos ditos superiores tendo escapado à geração. E indivíduos inferiores para as tarefas subalternas. A existência, banalizada, de organismos geneticamente modificados deveria pôr a pulga atrás da orelha: poder-se-ia, a curto prazo, empreender fabricar, por clonagem e modificação genética, novas variantes humanas. É até verossímil que experimentações estejam em curso ou possam não demorar a estar.

Quando esse dia chegar, teremos passado da pós-modernidade, período perturbado pelo desmoronamento dos ídolos, à pós-história. Se ninguém pode prever o que será isto, pode-se, entretanto, dizer o que não será mais. Porque significa o desenlace de cinco grandes topoï da humanidade: o fim da humanidade comum, o fim da fatalidade costumeira da morte, o fim da individualização, o fim do ordenamento (problemático) entre os sexos e a desorganização da sucessão de gerações.

Perigo para o animal inacabado

O perigo que ameaça a espécie humana não é só o eugênico. A curto prazo, é também e simplesmente a conservação e a perpetuação da própria espécie

O perigo que ameaça a espécie humana não é só o perigo eugênico. O que está em perigo, a curto prazo, é também e simplesmente a conservação e a perpetuação da própria espécie. Esta conservação não procede de si mesma; ela passa por um contexto simbólico e cultural. Isto se explica pelo fato, reconhecido por uma parte da pesquisa paleoantropológica, de que o homem é concebível como um ser de nascimento prematuro, incapaz de atingir seu desenvolvimento germinal completo e, entretanto, capaz de se reproduzir e de transmitir suas características de juvenilidade, normalmente transitórias entre os outros animais. Fala-se a esse respeito da neotenia do homem6 . Ela implica que este animal, não acabado, diferentemente dos outros animais, deve acabar-se em outro lugar que não na primeira natureza, isto é, numa segunda natureza, geralmente chamada cultura.

Encontram-se muitas coisas nessa segunda natureza: deuses, relatos, gramáticas referindo-se a qualquer objeto do mundo (as estrelas, os seixos, os micróbios, a música, a narrativa, o cálculo, a subjetividade, a sociabilidade...), uma intensa atividade protética (todos os objetos que permitem a esse animal não acabado habitar o mundo), leis, princípios, valores... Ora, se esse quadro for deteriorado, se as leis e os princípios que o regem se tornarem fluidos, pode-se esperar não só efeitos individuais e sociais deletérios, mas também ameaças sobre a espécie, pois nada mais será suficientemente legítimo para se opor a manipulações visando a transformá-la assim que possível.

A domesticação do Ser

A deliberação moral é tão pouco levada em consideração que, nesse discurso “desinibido”, só a técnica é que pode determinar uma ética

Algumas vozes já se fazem ouvir na intelligentsia para acolher a suposta boa nova e próxima mutação do homem. De modo muito especial, o filósofo alemão Peter Sloterdijk, que já se tornara famoso por haver feito no final de 1999, no além-Reno, uma conferência intitulada Règles pour le parc humain [Regras para o parque humano] 7 , por ocasião de um seminário dedicado a Heidegger. Esta conferência suscitou uma grande controvérsia, particularmente com Jürgen Habermas. Os propósitos desse “nietzschiano de esquerda” parecem muito significativos do modo como a desregulamentação simbólica atual pode confundir as mentes.

Numa outra conferência realizada no Centro Georges Pompidou, em março de 20008 , Sloterdijk retomou uma tese de Heidegger, mas para invertê-la. Não se tratava mais de dizer que a técnica era “esquecimento do Ser”, mas de proclamar que ela contribui para a “domesticação do Ser”, sendo esse o atributo maior do homem neotênico, levado a se produzir a si mesmo. Como se a técnica fosse a única conquista do homem neotênico e o contexto simbólico que faz prescrições e proibições nunca tivesse existido! Com tais premissas, todas as conseqüências possíveis da técnica são justificadas antecipadamente. Por outro lado, a deliberação moral é tão pouco levada em consideração que, nesse discurso “desinibido”, só a técnica é que pode determinar uma ética – não uma ética qualquer, mas, sim, uma “ética do homem maior” e, enquanto tal, aberta às “automanipulações biotecnológicas”.

A substituição do "homem primeiro"

O homem, puxado para fora de si mesmo pelo Ser, estaria encarregado de mudar sua condição biológica para se abrir à multiplicidade biológica

Nesse discurso, a ética consiste, pois, em afastar qualquer forma de exame moral. É assim que o homem, puxado para fora de si mesmo pelo Ser, estaria encarregado de mudar sua condição biológica para se abrir à multiplicidade biológica9 . O homem, nascido insuficiente e sendo produto da técnica, não teria outra coisa a fazer senão levar a técnica a suas últimas conseqüências. Deste modo, o velho homem deveria ser rebatizado de “homem primeiro” – em que se pode ouvir um claro eufemismo de “primitivo” (como em “museu das Artes Primeiras”) –, porque este homem já é somente um primitivo diante dos homens superiores que devem vir. Não se devia provocar a alucinação da volta do Ser na sinistra farsa histórica do nazismo – não havia ali senão um lamentável equívoco de meu caro mestre, parece dizer Sloterdijk. Não, é hoje que se dá o verdadeiro êxtase: o homem superior, o verdadeiro, chega e seus aduladores já o louvam e funcionam como polícia para lhe abrir caminho.

Ora, esse caminho está cheio de “homens primeiros” – eis o problema. Para nosso profeta, o velho homem primitivo é manhoso, é constitutivamente surdo – e eu cito – com “generoso potencial” de transformação “polivalente”. Pior ainda, por seu “antigo egoísmo”, ele só prestaria para “exercer o poder sobre as matérias-primas” para “delas dispor” a fim de livrá-las das mudanças prometidas – onde se compreende que tais “matérias-primas” poderiam até ser o próprio corpo humano. Evidentemente, esse velho homem não seria senão “o homem do ressentimento”, prestes a fazer “reuniões” para arregimentar “populações desinformadas” e levá-las a “falsos debates sobre ameaças não compreendidas, sob a autoridade severa de editorialistas lascivos”... Abaixo, pois, os velhos “humanólatras” que pretendem, movidos por “uma histeria antitecnológica”, opor-se ao salto para o qual o Ser nos chama porque, é evidente, não há “nada de perverso” em querer “se transformar através da autotécnica”...

Projeto pós-nazista

O verdadeiro problema do capitalismo é que ele funciona tão bem que um dia acabará consumindo tudo: os recursos, a natureza, – até os indivíduos que o servem

Esses propósitos de Sloterdijk – por seu próprio exagero – são muito úteis: permitem compreender que a atual desinibição simbólica não é somente uma questão de libertação dos costumes e de saída mais ou menos dolorosa do patriarcado. De fato, a suspensão atual das proibições revela que perdura um verdadeiro projeto pós-nazista de sacrifício do humano. Ele é sustentado pelo anarco-capitalismo que, ao mesmo tempo em que quebra todas as regulamentações simbólicas, possibilita que a técnica avance sozinha até quebrar a humanidade.

“O discurso capitalista”, já dizia o doutor Lacan, “é algo de loucamente astucioso [...], funciona perfeitamente, não pode funcionar melhor. Mas justamente funciona depressa demais, se consome. Consome-se tão bem que se esgota10 .” Em suma, o verdadeiro problema do capitalismo é que ele funciona bem demais. Tão bem que um dia acabaria consumindo tudo: os recursos, a natureza, tudo – até e inclusive os indivíduos que o servem. Na lógica capitalista, esclarecia Lacan, “o antigo escravo foi substituído” por homens reduzidos à condição de “produtos”: “produtos [...] consumíveis tanto quanto os outros11 .” Esta observação permite compreender que é exatamente nesse sentido muito ameaçador que devem ser entendidas as expressões levianamente eufóricas que se encontram em toda a literatura neoliberal: “o material humano”, o “capital humano”, a gestão esclarecida dos “recursos humanos” e a “boa governança ligada ao desenvolvimento humano”.

O anarco-capitalismo acreditou na idéia de que o dar-se leis é cruel e só confina a uma espécie de masoquismo insuportável. E remete cinicamente os que teriam necessidade de um suplemento de alma ao puritanismo obscurantista. É preciso, portanto, lembrar que os filósofos do Iluminismo, como Jean-Jacques Rousseau e Emmanuel Kant, diziam que a liberdade consiste apenas em obedecer às leis que o homem se deu. De fato, temos necessidade de verdadeiras leis jurídicas e morais – e não desses sucedâneos moralizantes – para, enfim, fazer justiça, para salvaguardar o mundo antes que seja tarde demais, para preservar a espécie humana ameaçada por uma lógica cega. Ora, estamos em via de ab-rogar todas as leis – exceto as do mais forte – e, se continuarmos nessa funesta direção, entraremos numa crueldade bem mais intensa que a de ter que se submeter a leis. Entraremos numa crueldade desconhecida que consiste em querer modificar esse corpo humano velho de 100 mil anos. Para, a partir dele, tentar improvisar outros.

(Trad: Iraci D. Poleti)

1 - Ver, de Dany-Robert Dufour, L’art de réduire les têtes ? sur la nouvelle servitude de l’homme libéré à l’ère du capitalisme total, Denoël, Paris, 2003.

2 - Karl Marx, Manifeste communiste, trad. Lafargue, Ed. sociales, Paris, 1976, p. 35
3 - Pic de la Mirandole [1463-94], Discours sur la dignité de l’homme, citado por Jean Carpentier, Histoire de l’Europe, Points, Seuil, Paris, 1990, p 224-225

4 - Em “La fin de l’Histoire dix ans après”, Fukuyama repete seu credo: “A democracia liberal e a economia de mercado são as únicas possibilidades viáveis para nossas sociedades modernas”. Mas ele reconhece uma insuficiência quanto à sua concepção do fim da história: “A História não pode se acabar enquanto as ciências da natureza não chegarem a seu termo. E estamos à véspera de novas descobertas científicas que, por sua própria essência, suprimirão a humanidade enquanto tal.”. Le Monde, 17 de junho de 1999.

5 - Cf. Francis Fukuyama, La Fin de l’homme: Les Conséquences de la révolution biotechnique, La Table Ronde, Paris, 2002.

6 - Ver os trabalhos do grande antropólogo norte-americano Stephen Jay Gould: Darwin et les grandes énigmes de la vie, [1977], Pygmalion, Paris, 1979, e Le pouce du Panda [1980], Grasset, Paris, 1982.

7 - Ver, de Peter Sloterdijk, Règles pour le parc humain, Mille et une nuits, Paris, 2000.

8 - Conferência retomada numa coletânea intitulada La Domestication de l’Etre, Mille et une nuits, Paris, 2000. Todas as citações que seguem foram extraídas desta obra.

9 - De fato, essa diversificação já está em curso: o semanário norte-americano Science, de 27 de julho de 2001, relatava que uma equipe norte-americana conseguiu implantar células-ovo cerebrais humanas no interior de cérebros de fetos de macaco Macaca radiata por volta da décima segunda semana de gestação, tal implantação podendo levar à criação de macacos cujos cérebros teriam sido, deste modo, mecanicamente “humanizados”.

10 - Jacques Lacan, “Conférence à l’université de Milan”, 12 de maio de 1972, texto inédito.
11 - Jacques Lacan, L’Envers de la Psychanalyse, Seuil, Paris, 1991, sessão de 17 de dezembro de 1969, p. 35.


Por que Zurdo?

O nome do blog foi inspirado no filme Zurdo de Carlos Salcés, uma película mexicana extraordinária.


Zurdo em espanhol que dizer: esquerda, mão esquerda.
E este blog significa uma postura alternativa as oficiais, as institucionais. Aqui postaremos diversos assuntos como política, cultura, história, filosofia, humor... relacionadas a realidades sem tergiversações como é costume na mídia tradicional.
Teremos uma postura radical diante dos fatos procurando estimular o pensamento crítico. Além da opinião, elabora-se a realidade desvendando os verdadeiros interesses que estão em disputa na sociedade.

Vos abraço com todo o fervor revolucionário

Raoul José Pinto



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