A governadora Yeda Crusius acredita que é uma ótima comunicadora. Já disse isso em várias ocasiões, de diferentes maneiras. Na entrevista que concedeu ao Roda Viva, da TV Cultura, mostrou, porém, os limites de sua crença e um sério problema com a verdade. Em mais de uma ocasião, sapateou em cima da verdade, apelando a uma retórica tecnocrática rasteira, à falsidade, à neurociência e a um conceito de pragmatismo que se pretende desprovido de qualquer conteúdo ideológico. Para transitar neste pântano semântico, tentou inventar uma nova língua. Vejamos alguns exemplos. No primeiro bloco do programa, quando perguntada sobre o projeto de aumento de impostos remetido à Assembléia, e rejeitado pela mesma, justificou a derrota apelando para um “problema de comunicação”.
Segundo ela, não se tratava de um tarifaço, mas sim de um “guarda-chuva de fundos reestruturadores da realidade”. “Senti um fracasso de comunicação”, disse. Por que será? Talvez pelo fato de ter passado boa parte da campanha eleitoral dizendo que não ia aumentar impostos. “Foi entendido como aumento de impostos. Não era. Eu só queria harmonizar a alíquota mínima do ICMS”. Segundo a governadora, ninguém entendeu o que ela queria, nem seu vice-governador, Paulo Feijó. “O vice não entendeu. Não entende até hoje”. E emendou: “As elites que fazem a política não perceberam o tamanho do problema”. Ah, essas elites, sempre com um déficit de compreensão a dificultar as causas populares. Ou seja, nem seus companheiros de partido, nem o seu vice-governador, nem as elites entenderam o que ela estava querendo dizer. Um “problema de comunicação”, sem dúvida.
Outro problema de comunicação apareceu em um curioso diálogo mantido com a escritora Lya Luft, que defendeu a redução da maioridade penal, justificando que “com 10, 12 anos, alguns já são psicopatas”. Yeda recusou a tese da redução da maioridade penal, mas logo em cima defendeu que há “um problema de saúde mental que leva à violência”, um problema que às vezes vem lá da gestação, e que a neurociência explica isso. Bem, essa é justamente a “tese” de Lya Luft. Desde muito cedo, nossa sociedade está formando psicopatas, defendeu. E, falando em psicopatas, a governadora disse que pretende ir aos Estados Unidos conversar com o procurador-geral Alberto Gonzáles sobre investimentos na política penitenciária do RS. Estranhamente, Yeda disse que viaja sem saber bem o que vai fazer lá.
“Eu vou lá para escutar. Eles é que estão dizendo que há uma política nova. Quero estudar nos EUA. Eles têm uma legislação diferente. Vou fazer uma palestra na Liga das Mulheres e quero falar com o procurador-geral”. O procurador, cabe lembrar, é o homem que inventou uma “legislação diferente” para justificar a prática da tortura nas prisões de Guantánamo e de Abu Ghraib”. Mas, enfim, Yeda vai aos EUA para aprender. Uma coisa que ela pode aprender aqui mesmo é o respeito à verdade. Pisoteou feio nela várias vezes. Uma quando disse que o Bolsa Família não exige contrapartida na freqüência escolar das crianças. É mentira. Outra quando falou que só proferiu uma vez a palavra “Ford” na campanha eleitoral. Mentira também. Também faltou à verdade quando disse que assumia a responsabilidade e não colocava a culpa nos outros. Ela não cansa de atribuir ao governo federal a responsabilidade por muitos dos problemas vividos pelo RS. Por fim, disse defender uma política externa pragmática, desprovida de ideologia, o que equivale a um círculo quadrado. Tem um singelo defeito: não existe. Esse problema a neurociência não explica. A Política, sim.
Escrito por Marco Weissheimer às 01h13
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