Investigações podem ser abertas na Câmara Municipal, na Polícia Federal e no TCU. Jogos, segundo vereadores, podem ter custado aos cofres municipais até R$ 4 bilhões. Cinco últimas edições do Pan, somadas, custaram R$ 2,1 bilhões. Prefeito César Maia (DEM) tenta barrar CPI.
Maurício Thuswohl - Carta Maior
RIO DE JANEIRO – O Pan-Americano do Rio de Janeiro ainda não terminou para César Maia (DEM). Alvo de inúmeras denúncias de má-gestão financeira dos Jogos, o prefeito trava encarniçada disputa política contra seus opositores na Câmara Municipal para impedir a instalação de uma CPI destinada a investigar as eventuais irregularidades cometidas. O pódio dessa disputa ainda sem vencedor só será montado no ano que vem, e sua cobiçada medalha de ouro é a sucessão na Prefeitura do Rio em 2008.
Se quiser alimentar alguma chance de subir ao degrau mais alto e fazer seu sucessor em outubro do ano que vem, César Maia terá que conter uma ofensiva na qual os adversários políticos prometem jogar peso nos próximos meses. Vereadores de partidos como PSOL, PT e PCdoB, e até mesmo dos outrora aliados PSDB e PV, denunciam que o Pan do Rio foi o mais caro de todos os tempos, com obras que acabaram custando até dez vezes mais do que o valor inicialmente estipulado, além de diversas outras irregularidades.
A Prefeitura publicou no Diário Oficial que o gasto público total do Município com os Jogos Pan-Americanos ficou em cerca de R$ 1,2 bilhão, mas a oposição garante que foi muito mais: “O custo inicialmente estipulado para o Pan, de R$ 400 milhões, pode ter saído até dez vezes maior, o que é um absurdo”, afirma a vereadora Andréa Gouvêa Vieira (PSDB).
Proponente e presidente da CPI do Pan, Eliomar Coelho (PSOL) também afirma acreditar que o gasto público foi maior que o anunciado pela Prefeitura. O vereador faz uma interessante ressalva: “Mesmo que o gasto tivesse sido esse de R$ 1,2 bilhão, já seria motivo para investigação. Os últimos cinco Jogos Pan-Americanos antes do nosso, somados, custaram cerca de R$ 2 bilhões”, afirma.
Eliomar continua seu raciocínio: “Quando o prefeito entregou à Odepa (Organização Desportiva Pan-Americana) o caderno de encargos financeiros com os custos inicialmente estipulados, a organização o aceitou porque sabia tratar-se de um montante razoável. Se fosse muito abaixo da realidade, como o prefeito alega agora, a Odepa teria percebido isso”.
PF também investiga
Em sua luta para fazer funcionar a CPI do Pan, os vereadores da oposição contam com o reforço da Delegacia de Crimes Financeiros da Polícia Federal, que abrirá inquérito para apurar denúncias de irregularidades cometidas pelo Comitê Gestor dos Jogos Pan-Americanos (CO-Rio). O delegado Joe Montenegro informou que vai procurar esta semana representantes do Ministério Público para discutir a possibilidade de abertura de uma ação conjunta.
Em outra frente, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou a suspensão de todos os pagamentos relativos aos convênios e contratos firmados para o Pan do Rio entre o Ministério dos Esportes, os governos estadual e municipal e a empresa Fast Engenharia e Montagens. Segundo o relatório do TCU, houve diferença de qualidade entre o material que foi comprado e o que foi efetivamente entregue ou instalado. Isso aconteceu com material de construção, tendas, cercas, cadeiras, mesas e aparelhos de ar-condicionado, entre outros.
Um exemplo do que diz o TCU pode ser o estádio João Havelange, mais conhecido como Engenhão. Construído especialmente para os Jogos, o estádio teve seu custo inicial de R$ 170 milhões elevado para quase R$ 400 milhões, valor equivalente ao estipulado inicialmente para todas as obras do Pan. Isso não impediu, no entanto, que dois muros do estádio desabassem em recentes ventanias. No incidente mais recente, um muro de 15 metros, situado ao lado de uma das rampas de acesso às arquibancadas, desabou. Técnicos da Prefeitura enviados ao Engenhão admitiram que os tijolos utilizados no muro eram mais finos que o inicialmente tratado no projeto.
Outro alvo da CPI do Pan serão as irregularidades cometidas na venda de ingressos. As denúncias neste item formam um vasto leque, que vai de ingressos vendidos em duplicidade a ingressos vendidos a “torcedores-fantasmas”, passando por falsificação de ingressos e falhas na entrega dos ingressos comprados pela internet. Em alguns casos, como nas semifinais e finais do vôlei e do basquete, os ginásios tiveram lotação muito menor do que sugeria o número de ingressos anunciados como vendidos.
Cesar adia CPI mais uma vez
Apesar das evidências, a oposição não vem conseguindo reunir força política para fazer a CPI do Pan virar realidade. Adiada pela primeira vez em junho, sob o argumento de que “mancharia a imagem do Pan e da cidade antes da realização dos Jogos”, ela foi mais uma vez rebatida na semana passada pelo eficiente bloqueio do time comandado por Cesar na Câmara Municipal.
Por três votos a dois, os vereadores da CPI resolveram adiar sua instalação até que fique pronto um relatório produzido pelo grupo de trabalho parlamentar criado para acompanhar o Pan. Este grupo, constituído a pedido de Cesar e composto majoritariamente por vereadores da base governista, tem prazo até novembro para apresentar seu relatório. Com isso, a CPI só seria instalada às vésperas do Natal, o que, na prática, jogaria essa discussão para o ano que vem e pouparia ao prefeito alguns meses de exposição pública negativa.
Votaram pelo adiamento da CPI os vereadores Carlo Caiado e Nadinho de Rio das Pedras, ambos do DEM, além de Luiz Guaraná, do PSDB. A manobra revoltou a oposição: “É uma ação organizada pelo prefeito para travar as investigações. Este grupo de acompanhamento, por melhor que seja, não tem a força de uma CPI no sentido de exigir o acesso a documentos, contratos e convênios”, afirma Eliomar Coelho que, ao lado da vereadora e ex-atleta pan-americana Patrícia Amorim (PSDB), votou pela instalação imediata da CPI.
Se depender da oposição, a disputa pela CPI do Pan pode ganhar as ruas. Os vereadores derrotados prometem mobilizar seus gabinetes para colher milhares de assinaturas da população e exigir a abertura das investigações. O PSOL, adianta Eliomar, estuda a possibilidade de realizar em breve uma manifestação: “É grande a indignação nas ruas do Rio com os custos elevados do Pan. O que vemos é muita reclamação vinda de pessoas que não aceitam um gasto desse enquanto setores como saúde, educação e transportes, entre outros, carecem de recursos há anos”.
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