Presidente da União de jornalistas de Cuba. Foi combatente clandestino durante a ditadura Batista (1957-1958), Militante do movimento Revolucionário 26 de julho, e preso politico em 1958. Secretário Geral Partido Unido da Revolução Socialista nos municípios havaneros de Campo Florido e Jaruco (1962-64), é deputado da ANPP (Assembléia Nacional do Poder Popular da Republica de Cuba), sendo vice presidente da Comissão das Relações Internacionales Asanblea Nacional e representante de Cuba no Foro Interparlamentar das Américas (FIPA).
A VERDADE: Como Cuba reage ao bloqueio midiático, e como os outros povos podem ajudar a romper o bloqueio?
TUBAL PÁEZ HERNÁNDEZ: Em primeiro lugar, o mais difícil para os cubanos é manter, nesses tempos, a independência. Um patriota cubano, José Martí, disse que a independência custa caro, e é preciso decidir a viver sem ela ou pagar seu preço. Os cubanos, muito perto do país que não respeita a independência, decidiram pagar esse preço. Digo isso porque se Cuba houvesse decidido ser uma neocolônia dos Estados Unidos, onde governasse o embaixador estadunidense, não teríamos esses problemas. Mas esse tempo acabou. Os Estados Unidos surgiram como potência quando nós surgimos como nação. Os Estados Unidos queriam estender seu território, ocupar Cuba, mas Cuba tinha dentro, cubanos que não queriam isso. Então se alguém me pergunta qual a característica principal dos cubanos, se é a música, a alegria, a improvisação, eu digo que é o antimperi alismo. Embora não manifestem militantemente ou eloqüentemente seu rechaço a um império, que quer assimilá-los, de uma maneira ou de outra, está presente, inclusive na emigração. Os que se vão, por melhoras econômicas ou diferenças políticas, levam dentro o gene do antiimperialismo. Posso dizer com absoluta responsabilidade, que os balseiros são a esquerda de emigração cubana, porque não se foram de Cuba por problemas de classe, porque eram do regime de Batista ou eram gente rica. Não, foram para remeter dinheiro para a família, no período especial. Creio que isso também está mudado, porque tem dentro de si muito claro o sentimento de nação independente. Explico isso, embora não esteja na pergunta, porque é base para entender muitas coisas. Nesse mesmo enfrentamento, os Estados Unidos, como eram mais fortes, descarregaram todo seu poder contra Cuba. E Cuba não pode responder, sua resposta é moral, sua resposta é o exemplo, a resistência, e isso não tem valor. Cuba é uma potência moral. Eu falei com uma mulher que vive em Cuba e foi ver sua família nos Estados Unidos, ao regressar disse: “Vi muitas coisas. Tudo que falta em Cuba, vi nos Estados Unidos, mas o que sobra em Cuba, não vi lá.” A solidariedade, a amizade, o apoio mútuo, o desinteresse, o altruísmo. Cuba é um país religioso, no sentido da fé, do altruísmo, do sacrifício pelos demais, que muitas religiões esqueceram, fazem negócios. Também há uma devoção ao passado, aos que deram tudo, aos patriotas, essa consciência, essa herança ajuda a enfrentar o bloqueio, que é brutal. Como já vivemos há 50 anos, as vezes não nos damos conta de que há coisas com uma raiz no bloqueio. Porque complica muito, se queremos comprar arroz temos que buscá-lo no outro lado do planeta. Trazer em barco, são 15 dias. O mesmo se passa com os medicamentos. Os Estados Unidos estenderam sua economia, suas empresas pelo mundo e impedem suas empresas no exterior de fazerem suas operações com Cuba. Por exemplo, um hotel do México, o Sheraton não pode hospedar cubanos. Um banco suíço, uma potência financeira, teve que pagar uma multa de 100 milhões porque teve operações com Cuba. Nós temos que fazer muitas operações clandestinas. Nós temos que comprar muitas coisas no mercado negro mundial, pagar mais. Um barco vindo de qualquer parte do mundo, que chegue em Cuba, não pode atracar num porto dos Estados Unidos por seis meses. É uma espécie de quarentena. Nenhuma linha quer fazer isso, por isso cobra mais. Outro exemplo, al gum medicamento de que eles tenham a patente, contra a dengue, a tecnologia, se Cuba quer comprar um avião, não pode comprar nos Estados Unidos. Se vai comprar na Alemanha, e tem um equipamento dos Estados Unidos, por exemplo, um computador, este país não o pode vender para Cuba. Se Cuba quer vender um equipamento médico para qualquer outro país, não o pode comprar um cidadão estadunidense se tem um componente cubano. Se um estadunidense compra um equipamento que tenha um componente cubano, os Estados Unidos o castigam. Eles mantém tribunais, a culpa, para os que mantém comércio com Cuba. É uma aberração total, algo demente, louco, esquizofrênico. O bloqueio é algo esquizofrênico. Um cidadão norteamericano não pode comprar um charuto cubano em Paris. Eles perseguem onde quer que vá, ao que comercia com Cuba. É um país poderoso que persegue dessa forma a um país pequeno. Os cubanos que vivem nos Est ados Unidos são o único grupo emigrante que não pode ir a Cuba quando quer, que não podem enviar dinheiro quando quer. Agora Obama liquidou as restrições postas por Bush, mas permanecem as que havia antes de Bush. Os cubanos lá residentes só podem ir a Cuba uma vez a cada 3 anos. Também diminuiu a quantidade de dinheiro que podem enviar a seus familiares em Cuba. Agora como aparece nos meios de comunicação? É como se uma gotinha de água fosse um tsunami. O níquel cubano não pode ir para as indústrias metalúrgicas estadunidenses, para a indústria automobilística. No caso dos desportistas, é igual, os equipamentos como cronômetros, laboratórios antidoping, tudo que contenha tecnologia estadunidense é muito difícil. São fatores que estimulam o antiimperialismo, mas Cuba não quer o bloqueio. Dizem que Cuba usa o bloqueio para justificar suas dificuldades, mas não é vedade.
A VERDADE: Se Cuba quiser comprar um avião, e o Brasil tem a Embraer, como se comporta o governo brasileiro? Facilita ou aceita o bloqueio?
TUBAL PÁEZ HERNÁNDEZ: Vou explicar outra complicação. Cuba não tem acesso a crédito. Para comprar um avião, tem que buscar quem o tenha para vender e forneça crédito. Ninguém compra avião a vista. Tem que conseguir um banco para comerciar o financiamento, e isso é um problema, porque Cuba não está no FMI, no Banco Mundial, no Banco Interamericano, e os bancos comandados pelos Estados Unidos não fornecem crédito, em nenhum serviço.
Aí há muitas coisas. Uma empresa que não seja dos Estados Unidos, de turismo, por exemplo, de cruzeiro, faz convênio com Cuba, e depois é comprada pelos Estados Unidos. Abre-se um processo de discussão, por causa da propriedade, e isso se passa amiúde e ficamos com a tecnologia, mas sem reposição. No setor dos meios de comunicação, com todos os equipamentos, impressão, maquinário de fotografia, afeta os jornalistas credenciados. Cuba não pode ter jornalistas nos Estados Unidos, enquanto se algum jornalista dos Estados Unidos quiser vir a Cuba, que venha. Como não somos demagogos nem cínicos, estamos pela verdadeira liberdade de expressão, há cerca de 160 correspondentes estrangeiros em Havana. São italianos, franceses, espanhóis, norteamericanos, a AP, a CNN, e nos Estados Unidos há só um jornalista cubano, e na ONU. Se lá houver um terremoto ou o utro problema qualquer, não poderemos cobrir. É a expressão da impotência de um grande país que precisa fazer isso, e os meios de comunicação tem contribuído para ocultar esse drama do público norteamericano, que nada sabe do bloqueio. Se algum dia o bloqueio for suspenso, muita gente não saberá. Então quais os efeitos da nossa profissão? O bloqueio cria uma psicologia na população e também nos jornalistas. Como cubano sofre o bloqueio, mas como jornalista se passa um fenômeno psicológico negativo, mau. Se tudo o que se diz de Cuba é mau, tudo o que digo para lá, é bom. E isso não é bom, não é positivo.
(...É como diz o refrão, é levar água para o moinho, vamos aumentar a lenha para o fogo). E nós como jornalistas sabemos que isso é ruim, que isso é uma tendência ruim que temos que superar para que o povo cubano mantenha a credibilidade).
Há certa educação política da população que compreende que há coisas que não se pode dizer. Se há um empresário canadense, espanhol, israelense ou de qualquer parte do mundo querendo construir um hotel em Cuba, ou uma cadeia de hotéis, os Estados Unidos o pressionam, dizendo que nem o empresário nem seus familiares poderão entrar nos Estados Unidos. Pode ser um industrial rico, que tenha um filho estudando nos Estados Unidos, o pressionam, e que faz um jornalista que tenha essa informação? Publica-a, mas se for nos Estados Unidos não a publica, fica em segredo. Imagine, nosso papel é informar e temos que calar, é uma autocensura, e isso produz dano. Porque às vezes calo sobre o que devo e sobre o que não devo. É um conflito permanente. Até que ponto a informação pode ajudar ao adversário. Nós temos um código de ética, e está tudo isso. Cuidar disso, das reações que podem ser negativas, identificar como uma falta, no jornalismo cubano pode ser sancionado o jornalista que faz apologia reiterada, triunfalismo reiterado, porque produz dano.
Outra manifestação do bloqueio é na Internet. Cuba está rodeada de cabos submarinos, de fibras óticas, todos de empresas norteamericanas, e Cuba não pode conectar-se. Temos que baixar Internet de satélite, e é muito caro. Agora com a colaboração do governo da Venezuela vai se estender um cabo pela Jamaica e Cuba, mais de mil quilômetros. Não só para receber, queremos também transmitir. Conectar a sociedade cubana com a norteamericana.
A VERDADE: Cuba foi expulsa da OEA. Que fará, agora que poderá voltar?
TUBAL PÁEZ HERNÁNDEZ: Cuba considera que foi uma boa notícia, uma boa reação. Que não foi obra da caridade norteamericana, mas da nova América Latina que está surgindo e não aceita o passado. Resolveram suspender a sanção à Cuba. Antes se dizia que Cuba estava a serviço da União Soviética, que já não existe. O mais duro foi quando se calaram quando houve a invasão de Playa Girón, quando mataram os professores, quando o bloqueio foi imposto não disseram nada, por ocasião dos atentados de Posada Carriles nada disseram, e está solto, então consideramos que a OEA não nos faz falta. Isso não resolve problemas em nenhuma parte. Se Cuba estivesse lá, seria uma voz a denunciar, uma voz inconveniente. Nós não temos nenhum interesse em voltar à OEA. Agradecemos profundamente, pois se busca reparar uma injustiça. Agora mesm o, poderiam ter feito uma declaração sobre o bloqueio, Posada Carriles saiu do Panamá e está solto apesar de condenado pelos tribunais da Venezuela e que se fez com esse terrorista?
A VERDADE: É mais importante para Cuba a extinção do bloqueio do que a volta à OEA?
TUBAL PÁEZ HERNÁNDEZ: Claro, claro, em primeiro lugar nós estamos em todas as organizações do mundo. Nas Nações Unidas, agora nos elegeram para a Comissão de Direitos Humanos, estamos nos não alinhados, estamos no UNESCO, na OMC, em toda parte, e temos relações com 179 países, para demonstrar que nós não estamos isolados. Já temos um espaço no mundo, e também com médicos, com professores, com desportistas. Nós propusemos ao Ocidente entrarmos com os médicos e ele com os recursos necessários para acabar com a SIDA/AIDS na África, e estamos esperando a resposta.
A VERDADE: Os Estados Unidos insistem que Cuba não respeita os direitos humanos. Como analisas o fato de estar na Comissão de Direitos Humanos da ONU e ser acusados de violá-los?
TUBAL PÁEZ HERNÁNDEZ: Nós consideramos que direitos humanos são indivisíveis. Não há direitos civis e direitos pela vida, são uma coisa só, e querem aplicar a Cuba os menos importantes. E nós não consideramos que sejam direitos humanos. O fato de não haver partidos não quer dizer que não haja direitos humanos. O tipo de democracia que quando surgiu não havia partidos. Em Cuba não há liberdade para organizar um partido. (...) O q há nos Estados Unidos é uma falsidade. Na União Européia agora mesmo, houve 45% de abstenção. E isso não resulta nada em sua vida. Os programas eleitorais quase todos iguais, ou muito parecidos, e o que vota é o dinheiro Em Cuba não vota o dinheiro, mas as pessoas. Liberdade de expressão, é impossível crer que alguém possa limitar a expressão. Há limites para a liberdade de expressão. Por exemplo, a apologia do fascismo, do racismo. Misturam liberdade de expressão com liberdade de imprensa, que não é mais do que liberdade para os negócios. Em Cuba todos os setores sociais tem órgãos de imprensa, tem meios de imprensa, rádios, tem até televisor, as organizações tem jornais, os periódicos mais importantes de Cuba não são do estado. Em Cuba o estado é o que menos meios tem e nem mesmo há um ministério de informação. Há rádio e televisão nacionais, mas a televisão local é a sociedade que organiza, é o município, a província quem organiza o conteúdo que se publica. Em Cuba não se publica nada contra o povo cubano. As vezes se escandalizam com os cem mil que se vão, mas nada se diz quanto aos que ficam, e são dez milhões e novecentos mil. A que país se abrem as portas, com trabalho garantido, dos Estados Unidos sem que todo mundo vá para lá? Os mexicanos tem um muro a separá-los dos Estados Unidos.
A VERDADE: Como o povo cubano reage ante a ação dos cubanos de Miami?
TUAL PÁEZ HERNÁNDEZ: A televisão, a rádio, são parte de um sistema do governo federal, sobretudo rádio e TV Martí. Nós não temos nenhum inconveniente em que o povo cubano escute e veja a rádio e TV Martí, mas não queremos que isso lhe seja imposto. Nós nos defendemos e fazemos interferência. Nós exigimos da televisão cubana a cada ano, que apresente seiscentos filmes norteamericanos, no canal aberto. Pela televisão aberta para a população. Porque queremos e não porque nos seja imposto. A televisão Martí interfere na nossa programação. Tem uma má programação. É uma programação do que se passa na província, do que se passa no país. É uma indústria que vive disso, lhe interessa ganhar dinheiro. A rádio e a TV Martí ganham 34 milhões de dólares todos os anos, e as outras, ganham 79 milhões de dólares para a subversão, usando a terminologia da Guerra Fria. Usam informações do governo, jornalistas independentes, especialistas, assessores.
A VERDADE: Os Repórteres Sem Fronteira atuam em Cuba?
TUBAL PÁEZ HERNÁNDEZ: O dinheiro dos Estados Unidos, se segue sua pista, e logo se descobre onde vai. Está provado q Repórteres Sem Fronteira recebe dinheiro da NET, uma organização federal dos Estados Unidos, e está a serviço da política e dos donos. Nós denunciamos, mas é uma organização fantasma, q tem um escritório em Paris.
A VERDADE: Cuba é um país pequeno, que recebe solidariedade de organizações de muitos países. Como Cuba vê isso?
TUAL PÁEZ HERNÁNDEZ: Considero que a solidariedade é um sentimento de amor. Se não fosse a solidariedade Cuba não existiria. Cuba é fruto de duas coisas- a decisão dos cubanos e da solidariedade.A solidariedade é obra de pessoas boas, e elas existem em todas as partes, e para nós é um estímulo, um alimento. Nós lutamos não só pelos onze milhões de cubanos, mas também pelos milhões no mundo que tem esperança. Agora, a solidariedade terá durante muito tempo que enfrentar a máquina de propaganda. Também há movimento de solidariedade com os palestinos. É uma razão a mais para lutarmos até a morte pelos amigos que caíram. Por exemplo, na Guatemala, onde foram treinados os mercenários que invadiram Cuba, assassin aram a nove guatemaltecos na rua. O tema dos 5 presos nos Estados Unidos, já penetrou nos parlamentos. A solidariedade é importante para combater a mentira.
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