(Pontos de encontro entre as obras de Edgar Morin, Fernando Pessoa e outros escritores)
Humberto Mariotti
(Fernando Pessoa)
O esforço para a reforma do modelo de pensamento que hoje predomina em nossa cultura tem várias vertentes. Muitos são os seus proponentes e diversificadas as suas propostas.
A obra de Edgar Morin está entre os pontos altos desse empreendimento. Em especial, destaca-se a sua mais importante concepção epistemológica, o pensamento complexo. Nele não predomina o raciocínio fragmentador (o modelo mental binário do “ou/ou”: ou amigo ou inimigo; ou bem ou mal; ou certo ou errado; ou ocidente ou oriente; etc.). Tampouco prevalece o utopismo da primazia do todo — o sistemismo reducionista.
Uma visão de mundo abrangente deve nascer da complementaridade, do entrelaçamento — do abraço, enfim — entre esses dois modelos mentais. Assim Morin denomina o pensamento complexo: o pensamento do abraço. Eis por que proponho, neste texto, falar sobre o que chamo de cinco saberes do pensamento complexo: saber ver, saber esperar, saber conversar, saber amar e saber abraçar. Todos estão inter-relacionados, abraçados, e por isso dependem uns dos outros para ser vividos em sua plenitude. Vejamos como.
Saber Ver
Jean-Paul Sartre, entre outros, percebeu que nossa existência é confirmada pelo olhar do outro. Mas não é necessário ser um filósofo para chegar a essa conclusão. Peter Senge1 relata que entre certas tribos do Natal, na África do Sul, o priincipal cumprimento é a expressão Sawu bona, que quer dizer "eu vejo você". As pessoas assim saudasdas respondem dizendo Sikhona, que significa "eu estou aqui". Ou seja: começamos a existir quando o outro nos vê.
E mais: existe, entre tribos africanas que vivem abaixo do Saara, a ética ubuntu, que vem da tradição Umuntu ngumuntu nagabantu, que em zulu significa “Uma pessoa se torna uma pessoa por causa das outras”. Para esses povos, quando um indivíduo passa por outro e não o cumprimenta, é como se houvesse se recusado a vê-lo, o que significa negar-lhe a existência.
Saber ver é antes de mais nada saber ver os nossos semelhantes. De fato, a localização anatômica dos nossos olhos mostra que eles estão orientados para ver o mundo — isto é, para ver o outro. Todos sabemos que há certas partes de nossa anatomia que só podemos enxergar em ângulos muito precários, e outras que não podemos ver de modo algum.
Convém notar que a unidimensionalização da visão — que nada mais é do que o resultado da apropriação do olhar pela cultura dominante — é um dos fenômenos mais alienantes do nosso cotidiano. A iconização da sociedade, isto é, o fornecimento de um mínimo de palavras escritas e um máximo de imagens padronizadas, conduz a uma diminuição do contato com a razão — o logos. Disso resulta a restrição ao acesso das pessoas ao imaginário, o que as leva a ver o mundo de modo concreto e literal.
Essa é uma das principais causas da redução da capacidade de lidar com a palavra e, por conseguinte, de conversar. É uma forma de dificultar a formação de consensos derivados da experiência e perpetuar a unidimensionalização. Trata-se de reprimir o imaginário e a diversidade em todas as suas dimensões: na linguagem escrita e falada, na expressão corporal, na produção de imagens e símbolos, enfim, em todos os meios pelos quais o indivíduo pode se opor à massificação.
As imagens e os símbolos veiculados pela linguagem tendem a quebrar a linearidade do nosso pensamento. Nesse sentido, os mitos são indispensáveis à facilitação das conversações e, em conseqüência, à formação de consensos. A experiência mostra que ao compartilhar histórias, lendas e narrativas, as pessoas vêem abrandado o seu ânimo competitivo e litigante.
No entanto, como alerta o historiador e mitólogo Joseph Campbell, os símbolos têm, ao longo da história, levado povos inteiros a comportamentos violentos e destrutivos. Para Campbell, muitos desses comportamentos resultam da interpretação literal do conteúdo de mitos heróicos. As metáforas são tomadas como reproduções exatas do real, e desse modo reaplicadas à prática.
É claro que essa espécie de compreensão pressupõe mentes como as nossas, condicionadas por uma cultura cujos mitos básicos configuram uma interminável crônica de guerras, pilhagens, vinganças e punições. É dessa maneira que os fundamentalismos reforçam os condicionamentos, que por sua vez reforçam os fundamentalismos e assim por diante.
A primitivização de nossas mentes pela supressão da palavra (em especial a palavra escrita) traduz-se na prática pelo estreitamento de nossa percepção de mundo. Dessa maneira, ela passa a depender de quase que um único sentido — a visão. A audição vem em segundo lugar, mas com menos destaque. Essa circunstância nos torna cada vez menos capazes de perceber a importância do conjunto.
Perdemos a abrangência de avaliação proporcionada pela totalidade dos sentidos, e dessa forma nos afastamos da perspectiva sistêmica de estar no mundo. Em conseqüência, as percepções veiculadas pelos sentidos que têm sido reprimidos e anestesiados são desvalorizadas, o que favorece a unidimensionalização e a manipulação.
É indispensável que evitemos assumir uma visão conspiratória desse fenômeno, para não cairmos mais uma vez no eterno equívoco (ou conveniência) de atribuir as causas de nossas dificuldades só a fatores externos, dos quais nos julgamos vítimas indefesas. Convém que estejamos alertas para essas circunstâncias, pois, ao que parece, muitos de nós estão convencidos de que a alienação das massas, com todas as suas conseqüências, resulta da atuação de um establishment onipotente, ao qual é inútil resistir. É com essa espécie de desculpa que costumamos fugir à responsabilidade de ter de lidar com o real.
Convém não esquecer que tudo isso vem acontecendo com a nossa anuência, consciente ou não. Essa postura de vítimas, aliás, expressa-se em nossa tendência a dar pouco valor às iniciativas individuais para a transformação social: se sou uma vítima, e ainda mais estando isolado, como poderei mudar alguma coisa? Muitos parecem não entender que para superar essa circunstância é fundamental o desenvolvimento do fabulário, que aglutina as pessoas. Parecem não compreender também que para isso a palavra, as imagens, os sons e as sensações tácteis e olfativas precisam caminhar juntos, como meios de percepção e integração de nossa experiência no mundo.
O que aconteceria se de repente perdêssemos a visão, ficando dependentes dos demais sentidos? Essa foi a idéia que levou o escritor português José Saramago a produzir o romance Ensaio Sobre a Cegueira. A história se passa em uma grande cidade, onde as pessoas começam a ficar súbita e inexplicavelmente cegas. Pior ainda, o problema é contagioso. O alastramento do surto marca o início de uma série de terríveis acontecimentos, centrados num só fato: as desventuras de uma sociedade que, acostumada à unidimensionalidade, a um modo quase único de perceber o mundo, é de súbito levada a depender por inteiro dos demais sentidos, que sempre havia mantido em plano secundário.
Continuemos com o romance de Saramago. Os casos de cegueira vão se multiplicando. A primeira providência tomada é previsível: os cegos são confinados, com guardas armados a vigiá-los — a clássica atitude concentracionária, à qual nossa cultura recorre sempre que tem de lidar com pessoas que de um modo ou de outro se revelam diferentes. A história prossegue, e logo se estabelecem entre os cegos confinados ações que oscilam entre a competição e a cooperação.
Seguem-se cenas em que essas circunstâncias se generalizam, e a disputa pela comida leva a conseqüências degradantes, que se alastram para fora do ambiente do confinamento.
O livro é uma metáfora das desventuras de uma sociedade cujo principal modo de perceber o mundo foi suspenso. A isso se adiciona o fato de que esse modo de percepção, por sua própria natureza, impele as pessoas a buscar referenciais externos, com o resultante apagamento progressivo da vida interior. No romance, ao se verem privadas desses referenciais (impedidas, por exemplo, de consultar o Grande Guru que é a televisão), elas se dão conta de seu vazio interno e partem para a busca de uma solidariedade perdida, o que é feito de modo canhestro e ineficaz. Não se pode, aliás, esperar outra coisa de indivíduos mais preparados para a competição do que para a parceria.
O romance de Saramago pode ser lida como um questionamento ao pensamento único, apropriado pelo poder de uma cultura em que o homem perdeu o sentido da globalidade e o de si mesmo. Nesse contexto, a proposta do pensamento complexo corresponde a uma retomada da pluri-sensorialidade. Esta pode ser considerada um equivalente orgânico da transdisciplinaridade — uma forma de ver e entender o mundo, traduzida em um saber que questiona a cegueira do modelo mental dominante.
Esse detalhe pode não ser claro para muitos de nós, mas não escapou à sensibilidade de um grande poeta. Falo de Fernando Pessoa, em cujos versos se lê:
E penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e com os pés
E com o nariz e com a boca.2
O que nos conduz de volta ao marco inicial: saber ver é saber ver o outro, único ponto de partida humano para começar a enxergar o mundo. Ou, como diz Pessoa,
O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê,
E nem pensar quando se vê
Nem ver quando se pensa.
Mas isso (tristes de nós, que trazemos a alma vestida!),
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender.3
A expressão “trazemos a alma vestida”, pode ser vista como uma alusão ao fato de nossa cultura estar atrelada ao modo de pensar binário, ou pensamento linear, o qual estreita e obscurece nossos horizontes mentais, e assim nos impede de perceber muitas das nuanças da realidade. Trata-se de um padrão que, entre muitas outras coisas, privilegia o conhecimento tecnocientífico e deixa em segundo plano a vertente humanística do conhecer.
Já versos como “isso exige um estudo profundo/uma aprendizagem de desaprender” nos conduzem ao que Morin viria reconhecer como a necessidade da reforma do sistema de pensamento acima mencionado, o que gerou sua atitude epistemológica fundamental: o pensamento complexo. É indispensável — sustenta o pensador francês — aprender a aprender.
Tudo isso visto, convém lembrar que os poemas aqui citados foram escritos no começo do século 20 (Pessoa morreu em 1935). Ou seja, bem antes de se começar a falar de modo constante em complexidade, reforma do pensamento, aprender a aprender e temas semelhantes.
O próprio Morin vê em Pascal a inspiração inicial de seu pensamento complexo. Percebe-se, então, como a vasta cultura literária e filosófica de Morin — à qual ele nunca deixou de recorrer — inspirou muitas de suas descobertas mais importantes. Assim, sua conhecida admiração pelos poetas e ficcionistas só faz enaltecer o seu trabalho.
Falemos mais um pouco sobre Fernando Pessoa. Os famosos heterônimos, por exemplo (Ricardo Reis, Álvaro de Campos, Alberto Caeiro e outros menores), correspondem às partes que compõem o todo de sua obra; e esse todo retroage sobre as partes realimentando-as. Eis aqui um dos princípios do pensamento complexo: as partes integram o todo mas não perdem suas características individuais.
Os heterônimos são partes, mas a obra pessoana não perde a unidade por causa da diversidade deles. Trata-se de uma evidência marcante da realidade do complexo que, como observa Morin, vem do latim complexus — aquilo que é tecido junto. Como na metáfora moriniana: os fios compõem o tapete; este só é tapete por causa dos fios; mas o que o constitui é a relação entre os fios de sua contextura e o conjunto da tapeçaria.
Em poucas obras literárias o fenômeno da unitas multiplex (unidade na multiplicidade) surge com tanto vigor como nos trabalhos de Pessoa.
Em meu livro As Paixões do Ego4 — do qual deriva este trabalho —, menciono ainda outra das múltiplas faces da contribuição pessoana. Além do que se viu acima, Pessoa figura entre os primeiros criadores literários a ter a intuição da fenomenologia, sem dúvida uma das vertentes do pensamento complexo.
Sabe-se que a poesia de Alberto Caeiro inclui a investigação de se a linguagem humana é ou não capaz de representar o real. Caeiro concluiu que ela não tem essa capacidade, ou a tem de forma limitada. Assim, diante da realidade o poeta opta por descrevê-la como ela se apresenta; busca mais mostrar do que explicar a experiência do ser humano em sua interação com o mundo.
A célebre frase “voltar às coisas mesmas”, de Edmund Husserl — introdutor da fenomenologia e da filosofia moderna na Alemanha —, significa que o esforço fenomenológico implica suspender os preconceitos, as idéias prévias, as teorias e, mediante essa disposição, observar os fenômenos tal como eles se apresentam à nossa experiência imediata.
O ânimo transcendentalista de Husserl acabou por distanciar a fenomenologia da vivência do cotidiano. Pessoa expressa em termos poéticos o que Husserl — ao menos nas etapas iniciais do método fenomenológico — diz em linguagem filosófica. Seu trabalho revela como a poesia, na qualidade de meio de compreensão do mundo, tem tanto a contribuir quanto a filosofia — não fosse ele, além de poeta, também um filósofo.
Por meio dos versos de Caeiro, a lírica pessoana entrelaça as consciências lógica e poética. Ela é, pois, uma forma de exercer a atitude fenomenológica; e com isso ajuda-nos, e muito, a lidar com a complexidade. Alguns exemplos:
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!5
(...)
Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e o sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.
Mas se Deus é as árvores e as flores,
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e lua e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E lua e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.6
(...)
Sim, eis o que os meus sentidos aprenderam sozinhos:
As coisas não têm significação, têm existência.
As coisas são o único sentido oculto das coisas.7
(...)
A espantosa realidade das coisas
É a minha descoberta de todos os dias.
Cada coisa é o que é,
E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra,
E quanto isso me basta.8
(...)
O Universo não é uma idéia minha.
A minha idéia de Universo é que é uma idéia minha.
A noite não anoitece pelos meus olhos,
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos
A noite anoitece concretamente
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.9
Saber Esperar
Para nós, não há nada mais difícil do que esperar. A exemplo do que fez com tudo mais, nossa cultura privilegiou a dimensão quantitativa do tempo. Deu primazia ao tempo medido em relação ao vivido. Como a temporalidade medida é, em nossa concepção, igual a dinheiro, e como o dinheiro com muita freqüência se relaciona a imediatismo, ansiedade e temor, saber esperar reduziu-se a um sinônimo de perder tempo, isto é, perder dinheiro e sentir medo.
Transformamos o tempo em uma coisa, uma mercadoria, como mostrou Marx em seus estudos sobre o tema. Na mesma linha, a apropriação do tempo (e a mecanização da gestualidade) das pessoas foi também consagrado como o ponto central do taylorismo — a “gerência científica” das linhas de produção industrial, que Charles Chaplin satirizou em Tempos Modernos.
Qualquer tentativa de fazer uma ontologia do tempo suscita desde logo a questão de se ele é linear ou circular. É importante registrar que nas três grandes tradições patriarcais de nossa época — o cristianismo, o judaísmo e o islamismo — o tempo é linear. Na Bíblia, com exceção do Eclesiastes, é assim que ele é considerado. Segundo essas tradições, marchamos sobre essa reta com princípio meio e fim determinados, sempre em direção a um alvo final — a morte — que pode representar a salvação ou a danação eternas. Não existe possibilidade de segunda chance.
É essa linearidade que torna possível as pressões, cobranças e advertências que instilam em nós o pavor em relação a esse marco do qual não se volta. Tal circunstância contribui, é evidente, para que encaremos a morte como um ponto final que nos apavora e não como um dado da vida. Tende também a fazer com que desvalorizemos a passagem, a trajetória, e tudo aquilo que com ela se relaciona.
Trata-se de uma unidirecionalidade que torna possível as ameaças partidas de deuses masculinos, severos, punitivos e fiscalizadores. Possibilitou, ainda, a emergência de filosofias como o determinismo histórico de Hegel, apropriado por Marx e transformado em uma espécie de via dolorosa, a ser percorrida na direção da beatitude final do comunismo salvador.
Além de levar à desvalorização do cotidiano, a retilineidade princípio-meio-fim dificulta muito a prática da tolerância, da serenidade e da compaixão. Por outro lado, sempre estimulou a “competitividade”. Porém, mesmo com o aceno a penas terríveis e com a impossibilidade de retorno, não se conseguiu evitar as infindáveis tentativas de burlar as punições mediante toda sorte de estratagemas, muitos deles antiéticos.
Tudo isso levou ao desaprendizado da espera. A concepção linear do tempo tornou possível, como já foi dito, a sua apropriação e transformação em mercadoria — ponto central da filosofia das linhas de montagem industrial e da idéia de produto acabado. A reificação, a quantificação e a comercialização do tempo fizeram com que ele se tornasse artificialmente escasso, e como tal objeto de usura. É o caso dos prazos bancários — e também da apropriação e desvalorização da temporalidade e da subjetividade.
Nesse modelo não há lugar para o ser humano individualizado, mas sim para o homem recortado, o homem-função. O padrão linear-quantitativo fez com que a técnica determinasse a vida humana e não o contrário. Temos uma enorme dificuldade de compreender que, ao ver o tempo só como um bem de consumo ou moeda de troca, perdemos a sabedoria da espera. Isto é: perdemos uma das dimensões mais importantes da nossa existência. Não sabemos distinguir o tempo cultural do tempo natural e pagamos muito caro por isso. Ao institucionalizar a temporalidade linear, deixamos de respeitar a diversidade das temporalidades individuais.
Essa é a tônica da nossa cultura, na qual os dominadores impõem aos dominados (mas também a si próprios) o seu modelo mecânico de temporalidade, e o tempo da cultura patente reprime o da cultura latente. É claro que precisamos dessa linearidade para as práticas da vida mecânica — mas não precisamos dela como indutora de paranóias.
Do ponto de vista qualitativo, o tempo não se ganha nem se perde: vive-se. Nas grandes tradições anteriores à judaico-cristã, a temporalidade é circular, reflete a dinâmica dos sistemas da natureza, o que nos mostra que vivemos num mundo de ciclos. Com elas, aprendemos que saber esperar é saber viver.
É preciso reaprender a aguardar o nascer do dia, o cair da noite, a chegada de uma estação do ano, as fases da lua, o desenvolvimento de uma idéia. Os ciclos da vida incluem o tempo de espera dos sistemas. Vivemos neles e eles em nós. Não há como desenvolver uma alteridade bem diversa da que vivemos hoje sem entender a complementaridade dos tempos linear (o tempo mecânico-produtivista) e não-linear (o tempo sistêmico). Ela nos levará a uma visão complexa da nossa temporalidade.
E preciso, por exemplo, não pretender apressar a chegada da felicidade. Essa proposta não quer dizer que devamos esperá-la passivamente, mas por outro lado mostra que de nada adianta persegui-la como se ela fosse uma caça. Com efeito, a experiência mostra (e insistimos em não aprender com ela) que é a perseguição ansiosa da felicidade que muitas vezes nos faz infelizes.
Aqui, a noção de coisa mais uma vez faz com que ignoremos a de processo: a felicidade que se busca com tanta sofreguidão é apenas a da acumulação material. Essa é a idéia de felicidade que herdamos do Iluminismo, e que continua em vigor até hoje. Ela pressupõe que as sociedades caminharão sempre rumo à perfeição, que o evoluir da história está predeterminado por leis fixas e que o indivíduo, na qualidade de instrumento desse determinismo, é conduzido por ele.
Trata-se, pois, da idéia de felicidade projetada sobre uma linha de tempo, sujeita à quantificação e que suscita, no outro pólo, a noção de escassez. Esta, por sua vez, produziu a convicção de que prolongar o processo vital é igual a prolongar a felicidade. Trata-se de um ponto de vista em princípio razoável, mas que em certos casos, além de desvalorizar o momento presente, inspira ações de postergação artificial da vida em situações em que ela já não é compatível com a dignidade humana.
Fala-se pouquíssimo na felicidade que surge no aqui-e-agora do convívio das pessoas — a felicidade solidária. É compreensível: nosso cotidiano competitivo pode ser tudo menos feliz, embora seja nele, e não num reino transcendental, que temos de viver. Nossa mente tem pouca capacidade de entender e valorizar a felicidade que emerge da convivência. Um dos motivos para isso é que esta não é facilmente apropriável e transformável em moeda de troca, como se faz com o tempo.
Os obstáculos a essa compreensão são muitos e estão muito enraizados nos cânones de nossa cultura, segundo os quais é preciso competir, batalhar, ganhar muito dinheiro para poder comprar a felicidade. Na prática, as pessoas não raro acabam concluindo que é tão difícil ser feliz por esses meios que imaginam que o seja por todos os demais. E assim, no fim das contas, acabamos nos considerando incapazes de ser felizes seja de que maneira for.
A felicidade não está no término de uma linha de tempo, na qual o começo e o meio também estão predeterminados. A própria idéia de conquista subentende-a difícil e fugidia. Nessa ótica, ela é considerada uma forma de vantagem e continuamos a persegui-la por toda parte — menos onde se encontra: no espaço de convivência com o outro humanamente legitimado, e no respeito ao tempo de que ela precisa para emergir.
Saber esperar não é uma condição que deriva de um conjunto de regras, de um sistema filosófico ou de uma disciplina pragmática. Tampouco é uma condição transcendente, à qual devemos nos curvar movidos pela fé. Trata-se de uma dimensão importante da condição humana, e negá-la é negar a própria essência do viver.
Não é por acaso que saber esperar é uma dimensão tão feminina. Na mulher, essa característica não é uma virtude, uma proposta metafísica ou um valor moral. Pode até evoluir para tudo isso, sem dúvida, mas no princípio, na base, saber esperar é uma questão biológica. A mulher é um ser lunar, que sabe que precisa aguardar pelos grandes ciclos de seu universo orgânico: o menstrual, o gravídico, o puerperal, o do aleitamento. Ela sabe que não há como tentar acelerá-los, nem competir com eles sem que os resultados sejam desastrosos. E é essa sabedoria do viver que a capacita para a sabedoria do conviver.
Aprender com a mulher os mistérios da temperança e da serenidade é algo que nós, os homens, precisaríamos voltar a fazer.10 Digo voltar, porque já sabemos que era assim nas ancestrais culturas matrísticas. Se existe uma biologia do amor, existe também uma biologia da espera, e saber exercê-la é o caminho natural para aprendermos a lidar com a ansiedade e o imediatismo. Não estou dizendo que a mulher é superior ao homem ou vice-versa, mas convém lembrar que, em nossa cultura, um dos grandes obstáculos à compreensão e aceitação da biologia da espera é a tradicional desvalorização do feminino.11
Há muito que lançamos sobre as mulheres a culpa pelas dificuldades e frustrações que nosso imediatismo nos faz passar. Projetamos nelas os preconceitos oriundos de nossa insistência em negar a não-linearidade e a complexidade inerentes ao mundo e ao tempo. Por isso, dizemos que elas são imprevisíveis, inconstantes, obscuras, difíceis de lidar. Ou seja, dizemos que a mulher encarna todos os aspectos da vida que nossa mente racionalizadora não consegue pôr sob controle, esquecidos de que, ao nos expressarmos assim, reafirmamos que o feminino é a própria vida, da qual tanto nos queixamos, e à qual, ao mesmo tempo, tanto nos apegamos.
Saber Conversar
O que para nós é claro, pode ser incompreensível para o outro. Como observam Joseph O’Connor e Ian McDermott, em princípio tendemos a julgar a nós mesmos pelas nossas intenções e não pelo resultado de nossos atos.
Esse pressuposto em muitos casos nos leva a ser auto-tolerantes: se algo dá errado, ou se o resultado de nossas atitudes prejudica alguém, sempre poderemos dizer que não era essa a nossa intenção. Por outro lado, costumamos julgar o outro não pelas suas intenções (que nem sempre podemos adivinhar), mas por seu comportamento. Se algo não dá certo, ou se alguém é prejudicado, torna-se bem mais difícil sermos tolerantes com ele.
Mas ocorre que o tipo de alteridade ao qual estamos culturalmente determinados — gerador de mil cautelas, medos e desconfianças — não nos põe à vontade para conversar de modo aberto sobre as nossas intenções. Ao contrário, muitas vezes tendemos a escondê-las ao máximo. Se avalio o outro apenas pelo seu comportamento (e não pelo seu comportamento mais as suas intenções), é claro que ele me julgará do mesmo modo.
Esse é mais um dos resultados da limitação de nossas percepções e entendimentos pelo raciocínio de causalidade simples, que reforça a desconfiança e a constante busca de “provas”, aumenta o nível de cobranças e dificulta a tolerância. Somos inclinados a reagir a comportamentos e não a interagir com intenções e condutas.
Modificar o nosso modelo de conversação constitui, talvez, a melhor forma de lidar com essa dificuldade. Sabemos que nosso conversar é determinado por um alto nível de institucionalização. Em nossa cultura, não são muito freqüentes as oportunidades de falar com liberdade e sinceridade. Essa situação poderá mudar de modo significativo, se e quando conseguirmos transformar nossas conversas em trocas de intenções, em vez de continuar a fazer delas meios de ocultá-las. É preciso construir uma ética do dialogar, cujo ponto de partida pode ser a aprendizagem de como receber feedback (em especial o negativo) e mudar em função disso.
É claro que essa atitude não significa que devemos fazer tudo o que o outro quer. Nosso principal empenho será fazê-lo dar-se conta de que estamos procurando entender que seu comportamento provavelmente reflete as suas intenções, e que esperamos que ele faça o mesmo a nosso respeito.
Precisamos estar bem conscientes, porém, de que a alteridade que baliza a nossa cultura potencializa as posições reativas e dificulta as criativas, o que não quer dizer que devamos renunciar a estas. A chave para compreender esse sistema é tentar chegar às intenções do outro.
Tudo bem examinado, deduz-se que saber conversar é algo que só se aprende quando se é livre. Entre as muitas maneiras de definir o que significa ser livre chama atenção a de Viktor Frankl, que definiu liberdade como o intervalo entre o estímulo e a resposta, isto é, o espaço entre as questões que o mundo nos propõe e as respostas que lhe damos. Frankl sabia o que dizia. As bases de seu pensamento — que deram origem a uma corrente de psicoterapia existencial, a logoterapia — começaram na década de 20, mas foram consolidadas em sua experiência como prisioneiro de campos de concentração nazistas.
O psicoterapeuta Rollo May define liberdade do mesmo modo: como a possibilidade que uma pessoa tem de estabelecer uma pausa entre o estímulo e a resposta e depois orientar-se para uma determinada atitude, escolhida entre várias outras. É esse intervalo, esse pequeno interstício, que convida as pessoas a serem livres. E é dele que temos tanto medo: sempre que chamados a visitá-lo, refugiamo-nos no já visto, no conhecido. Essa é a principal forma de manter conversações que costumam louvar as virtudes do novo e queixar-se da repetitividade da vida, mas que são, elas próprias, repetitivas em sua insistência em opor-se a novas maneiras de ver o mundo.
Quando digo que precisamos reaprender a conversar, estou me referindo a essa circunstância. Reaprender a conversar significa aprender de novo a utilizar nossos espaços de criação. Mas, como sabemos, o medo de ser livres faz com que fujamos deles. Essa fuga se faz com mais freqüência por meio de nosso hábito de fazer perguntas padronizadas, as quais por sua vez suscitam respostas estereotipadas. Ou seja, dizemos o que os outros querem ouvir para que eles nos respondam o que queremos ouvir — e assim nada se aprende e nada se ensina.
Se cada um de nós percebe o mundo segundo a sua própria estrutura, saber conversar significa antes de mais nada saber perguntar. Expliquemos. Em nossa cultura, muitas vezes o diálogo se torna uma competição, na qual se decidirá quem fala melhor, quem argumenta com mais brilhantismo e assim por diante. Em geral, julgamos que uma questão bem formulada é aquela que põe o outro em dificuldades. Sentimo-nos vitoriosos quando conseguimos embaraçar o nosso interlocutor. Propor-lhe perguntas difíceis, acuá-lo, significa para nós um triunfo. Com muita freqüência, usamos as perguntas não para conversar, para aprender algo, mas para “vencer” um debate.
O modo como o interlocutor entende o nosso questionamento depende de sua estrutura, não do que perguntamos. Saber perguntar é fazer perguntas que produzam alterações no questionado, isto é, que o levem a aprender algo, a modificar-se e depois partilhar conosco o que aprendeu. Nesse sentido, saber questionar, antes de ser uma pretensão a receber algo de quem se pergunta, equivale a dar-lhe uma oportunidade de transformar a sua estrutura, isto é, de aprender. Trata-se, no fim das contas, de um processo maiêutico.
Ensinar é propor questões mobilizadoras. Estas produzem em quem as formula uma expectativa respeitosa diante da resposta, e é por isso que saber questionar conduz a saber ouvir. Não pode haver indagações adequadas sem a conseqüente preparação para receber o retorno.
Saber questionar equivale a desencadear um processo de co-educação. Krishnamurti costumava dizer que o verdadeiro problema da educação são os educadores. Marx preocupava-se em saber quem os educaria. Se partirmos do princípio de que o verdadeiro papel dos educadores é formular perguntas adequadas, segue-se que quem os educa são os educandos, ao dar-lhes as respostas.
Nós somos o mundo. Quando perguntamos algo a alguém, é o próprio mundo que se abre para essa pessoa, não para desafiá-la ou constrangê-la, mas para proporcionar-lhe uma oportunidade de modificar-se e, a partir daí, modificá-lo. Do mesmo modo, ao recebermos a resposta é do mundo que ela vem. Nesse sentido, conversar com o outro significa que o mundo está conversando consigo próprio por nosso intermédio — é por isso que conversar significa estar-com, encontrar-se, religar-se, descondicionar-se, libertar-se. Eis a essência da autoprodução.
George Johnson assinala que quando lemos algo, ou quando conversamos com alguém, essa experiência produz modificações físicas em nosso cérebro (isto é, mudanças de estrutura), que se manifestam pela formação de novos circuitos neuronais e mobilizações de memória, que por sua vez levam a dinâmicas diferenciadas. Logo, a multiplicação dessas conexões e sua organização em forma de rede constituem o ponto central de qualquer processo importante de transformação. Muitas vezes, absorvidos com a possibilidade do emprego de métodos e técnicas mais elaborados, esquecemo-nos de que a fluidez e a naturalidade das conversações compõem o que há de mais simples e importante para essa finalidade.
Se o que define uma cultura é o conteúdo das redes de conversação que a percorrem e compõem, saber conversar é saber construir um universo cultural. Conversar é aprender, mesmo quando por um motivo ou por outro nosso interlocutor não é capaz de nos dar a resposta que consideramos “certa”. Dizer ao outro o que ele quer ouvir — e fazê-lo retrucar na mesma medida — não é conversar, é monologar.
A conversação constitui uma oportunidade para que as emoções de cada interlocutor se reorganizem. Como diz Maturana, ela promove o entrelaçamento do emocional com o racional. Daí a importância dos pequenos grupos. Eles representam a ampliação dos espaços de liberdade individual e, em conseqüência, das possibilidades de aprender a conversar.
A diversidade de opiniões que caracteriza os grupos assim formados faz com que esses espaços de criação jamais se fechem nem sejam preenchidos. Eles precisam ficar sempre abertos, porque constituem uma região de troca e enriquecimento. Educar-se é adquirir a capacidade de identificar e ampliar ainda mais os espaços de conversação e, sobretudo, mantê-los sempre permeáveis.
A linguagem não acontece nos interlocutores e sim no “entre”, no espaço comum criado entre eles e por eles. Ocorre no intervalo de liberdade há pouco mencionado. Além disso, as modificações estruturais produzidas pela linguagem não se limitam ao campo verbal nem ao momento em que ocorrem as conversas.
Já sabemos, com Humberto Maturana, que a linguagem promove modificações estruturais porque coordena (organiza, sintetiza) os nossos comportamentos e, ao relatá-los, contribui para que eles se modifiquem. As interações (os encontros) deflagram mudanças nos sistemas vivos: são as coordenações. A linguagem coordena e relata essas coordenações. Ela é, portanto, a coordenação das coordenações.
Muitas das dimensões de nossas interações são inconscientes, mas nem por isso deixam de participar dessas relações. Se é certo que boa parte da nossa conduta é determinada pelo inconsciente, isso não quer dizer que nos devamos entregar por completo às prescrições dessa parte oculta de nossa psique.
Podemos lidar com elas de vários modos. O principal consiste em fazer com que os conteúdos inconscientes venham à tona, para que possamos tentar examiná-los e, dentro do possível, fazer escolhas. Para a promoção dessa emergência a conversação é indispensável. Por isso é que afirmo que saber conversar é saber ser livre.
Saber Amar
Se o inferno são os outros, a felicidade também o é. Se não existe inferno sem os outros, também não há felicidade sem eles. Amar é algo que já se nasce sabendo. Em geral, os pais tentam educar as crianças para aperfeiçoá-las nesse saber.
Procuram criar um ambiente onde elas tenham oportunidades de desenvolver aquilo para o qual nasceram, isto é, respeitar os outros e o mundo natural.
Mas sabemos que ao crescer elas se vêem obrigadas a enfrentar uma cultura que é o oposto de tudo isso. Têm de desaprender a amar, e disso se encarregam a racionalização, as ideologias e o conformismo, cuja estratégia é transformar o amor em um produto raro, difícil de obter e por isso mesmo muito valorizado no “mercado”. Esse fenômeno não afeta com a mesma intensidade os dois sexos, como veremos logo mais.
Jean-Jacques Rousseau12 fala do amour de soi (amor de si) e do amour propre (amor-próprio). No primeiro caso, o amor precede as posturas morais e se relaciona ao mundo dos instintos. É o amor pelo que somos, mas que se amplia em termos de amor ao próximo. Por outro lado, o amor próprio é o sentimento que nos leva a comparar-nos aos outros e julgar-nos superiores a eles.
Esses conceitos nos proporcionam mais uma forma de definir a cultura do patriarcado, na qual prevalece o amor próprio, e também a cultura matrística, em que predomina o amor de si, que leva ao sentimento de participação, à aceitação do corpo e da sexualidade e à legitimação do outro. No caso do amor próprio predomina a repressão, a vergonha do corpo e da sexualidade e a ânsia pelo domínio do mundo natural. Não é difícil, pois, compreender por que a mercantilização do amor e da sexualidade constitui uma das faces mais destacadas da cultura patriarcal.
Rousseau fala de outro sentimento, a que deu o nome de idéia de consideração, que é uma espécie de intermediário entre os anteriores. O filósofo mostra como é vital para os homens viver em sociedade. Essa condição se manifesta pela necessidade que os seres humanos têm de serem vistos uns pelos outros. Vem daí a idéia de que o outro é um complemento indispensável do eu, o que coloca a sociabilidade no próprio cerne da situação humana.
Humberto Maturana e Gerda Verden-Zöller sustentam que somos seres dependentes do amor. Vivemos, porém, em uma cultura que se caracteriza pela agressão e pelas guerras — uma cultura de desamor. A questão que esses autores propõem é a seguinte: os seres humanos são animais geneticamente agressivos e às vezes amorosos, ou são animais amorosos que às vezes se tornam agressivos?
Há outra maneira de formular a pergunta: os seres humanos são animais geneticamente patriarcais, que às vezes agem de modo matrístico, ou são animais geneticamente matrísticos e culturalmente tornados patriarcais? Se recorrermos à teoria do cérebro triúnico, de Paul Mac Lean, a questão poderá ser enunciada ainda de outra forma: somos animais guiados pelas determinações do cérebro reptiliano (agressivo), que às vezes agem segundo as determinantes do cérebro mamífero (afetivo), ou o contrário?
Pouco importa a forma de indagar. Sabemos que Maturana afirma que nossa agressividade é (ou ainda é) de origem cultural. Sustenta, além disso, que somos seres que vivem na linguagem. Se esta desaparecesse, também desapareceríamos como humanos. Essas noções permitem entender de outra forma o que foi dito há pouco. Se as crianças já nascem sabendo amar (isto é, se são biologicamente amorosas e às vezes agressivas), as conversações da cultura em que vivem é que fazem com que elas desaprendam o amor. Em conseqüência, passam a comportar-se de forma agressiva, mesmo sendo geneticamente amorosas.
Como se vê, o raciocínio de Maturana é biológico, e vê o amor não como uma dimensão excepcional ou virtude transcendente, mas como um fenômeno da natureza. Nesse sentido, a vida amorosa é uma forma de exercermos essa condição. É o que ele denomina de biologia do amor.
Mas esse reducionismo inicial abre caminho para muitas reampliações. Amar o outro significa reconhecê-lo e legitimá-lo, sem que ele precise de nenhum modo justificar a sua humanidade. Todavia, vivemos em uma cultura em que prevalecem o não-reconhecimento e a exclusão. Nesse caso, o outro não é aceito como humano a priori: reservamos esse privilégio para nós próprios e, a partir daí, pretendemos impor-lhe os nossos valores. Isso significa que passamos a exigir do outro mais e mais provas de sua humanidade e, por mais que ele as forneça, estaremos sempre prontos a desqualificá-las.
Cabem aqui mais algumas reflexões. Se estamos há tanto tempo orientados para o desamor e para a agressividade, será que ainda há possibilidade de mudança? Ou, de forma ainda mais pessimista, será que esse ponto já não foi ultrapassado e agora malhamos em ferro frio?
É muito difícil responder, pois qualquer resposta só poderia ser dada nos termos dos nossos condicionamentos. Até que consigamos reduzir ao menos um pouco essa limitação, quaisquer tentativas nesse sentido levarão a conclusões equivocadas. De modo que nesse caso somos levados a pensar em termos excludentes: ou nos resignamos ao que se vem repetindo há séculos — que o homem é biologicamente mau e nada se pode fazer quanto a isso —, ou prosseguimos com nossos esforços de reforma do pensamento.
Há pouco, observei que amar é algo que já se nasce sabendo, mas que a cultura dominante nos levou a desaprender. Assinalei também que essa desaprendizagem não afetou na mesma proporção os dois sexos. Com efeito, o antropólogo Ashley Montagu observa que a mulher cria e conserva a vida, enquanto o homem a mecaniza e destrói. Para Montagu, o amor da mãe pelos seus filhos é o grande modelo para todas as demais formas de relacionamento. Já no fim dos anos 60 ele observava, embora não utilizasse essa expressão, que as mulheres são mais preparadas do que os homens para pensar em termos sistêmicos.13
As palavras desse autor mostram como, em geral, as mulheres não se deixaram condicionar tanto quanto os homens pelo pensamento linear. Pode-se dizer que elas são as grandes produtoras e mantenedoras do modelo mental sistêmico, representado pela intuição, que com tanto empenho aprendemos a desprezar. Assim, deduz-se que saber amar é algo que os homens precisam reaprender com as mulheres. Como diz Montagu, o que precisamos é de um pouco mais do espírito feminino e um pouco menos da agressividade masculina.
O homem pode aprender com a mulher a pensar em termos sistêmicos, e, a partir daí, ambos podem chegar a uma visão complexa de mundo. Mas para tanto ele precisa deixar de impor-lhe a sua linearidade. Isso feito, a complementaridade ocorrerá de modo espontâneo, porque os processos naturais são cooperativos e competitivos e não — como se pensou durante muito tempo — só competitivos. A “competitividade” é uma circunstância cultural, criada pelo medo que aprendemos a ter uns dos outros. Nós, do sexo masculino, precisamos de ajuda para sair dessa situação, e esse auxílio está bem mais próximo do que imaginamos.
É evidente que aqui não me refiro ao feminino como sexo. Meu propósito é bem mais abrangente: falo de um amplo conjunto de qualidades e habilidades próprias da totalidade do ser humano que, no momento atual e pelas razões já apontadas, as mulheres encarnam de forma mais ampla e mais clara. De todo modo — e com Montagu —, reflitamos sobre o que diz Biron, personagem de Shakespeare:
From women’s eyes this doctrine I derive:
They sparkle still the right Promethean fire;
They are the books, the arts, the academes,
That show, contain and nourish all the world:
Else none at all in aught proves excellent.14
[Dos olhos das mulheres tiro esta doutrina:
Elas ainda brilham como o verdadeiro fogo prometéico;
Elas são os livros, as artes, as academias,
Que mostram, contêm e nutrem o mundo inteiro:
Sem isso, de qualquer forma, nada mais dá provas de excelência.]
Maturana observa que só o amor expande a inteligência, e parece não haver dúvidas a esse respeito. Nesse sentido, sustento que viver a biologia do amor é viver de modo inteligente, isto é, de forma competente, o que significa entre outras coisas deixar de querer reduzir mistérios a problemas e vice-versa.. A inteligência é ao mesmo tempo o resultado do amor e a vertente que o faz brotar. Quem ama estende a mão. Quem estende a mão prepara-se para o abraço — e não se pode abraçar a quem não se ama.
Saber Abraçar
Para saber abraçar, é preciso antes saber amar. Surge então a pergunta: o que será que eu preciso ver no outro para que possa sentir vontade de abraçá-lo, isto é, tornar-me solidário com ele? Em primeiro lugar, preciso ver a mim mesmo, e é por isso que devo evitar projetar nele o que não desejo em mim. A maneira como vejo o outro depende mais de mim do que dele, isto é, como trabalho o meu ego e dos resultados a que chego.
Nosso ego funciona como o guardião dos condicionamentos de nossa mente. É o meio pelo qual pomos em prática a razão instrumental. Trata-se, como se sabe, de uma dimensão instituída, isto é, elaborada pelas circunstâncias da cultura. As pessoas que se empenham em um trabalho sobre si próprias, seja pela psicoterapia, seja por outros processos de desenvolvimento pessoal, podem chegar a uma outra dimensão egóica — o ego trabalhado — que se aproxima de um modo de viver não apenas mecânico.
Trata-se de uma dimensão participante. Não estou propondo que tenhamos dois egos, é claro. Ao nos darmos conta desse redimensionamento, porém, percebemos nossas possibilidades e limitações. Defrontamo-nos a um só tempo com a liberdade e com o nada.
Martin Heidegger diz que há duas formas fundamentais de existência humana. A primeira se caracteriza pelo esquecimento do Ser. A outra tem essa consciência, e faz com que vejamos a morte como um fato da vida e não apenas como o seu término. No primeiro caso, temos a existência pautada pelo ego-pensamento, que produz o homem individualista. No segundo, surge o modo de viver do homem que se fez indivíduo sem se afastar de seus semelhantes.
A marca central da inautenticidade é a perda do sentido de totalidade. Talvez seja essa a noção que temos maior dificuldade de compreender. Quando um indivíduo se mantém inteiro, adquire a compreensão de que essa integridade pode e precisa ser partilhada com o outro, isto é, com o mundo. A essência do ser humano se define por meio de sua relação com o mundo, e guarda também uma afinidade indispensável com a totalidade do Ser. Espinosa expressa essa circunstância ao dizer que essa ligação configura uma unidade que é a própria natureza. Esse é um dos motivos pelos quais a idéia de razão desse filósofo é, na essência, ética.
Aceitar a morte como um fato da vida equivale a admitir nossa vulnerabilidade e finitude. O homem individualista, que se pretende imortal, acha que não precisa de ninguém. O homem-indivíduo pensa o oposto. Nos termos do mito do curador ferido, sua posição corresponde a admitir a possibilidade de estar lesado e, em conseqüência, respeitar as feridas dos outros e dispor-se a ajudar a cuidar delas.
Sem essa consciência não poderemos instaurar uma nova ética da alteridade. Acompanhando Montaigne, Goethe assim expressa a nossa situação: “Os homens trazem dentro de si não só a sua individualidade, mas a humanidade inteira, com todas as suas possibilidades”. Se persistirmos na recusa de assumir na prática essa condição, continuará a ser para nós muito fácil agredir e eliminar o outro — e, convenhamos, não pode haver vontade de abraçar aquele a quem vemos como um condenado.
A idéia da morte valoriza a nossa existência e faz com que valorizemos a vida do outro. Nas palavras do psicoterapeuta Irvin Yalom, se a morte destrói o homem, a idéia dela o salva. Aceitamos a morte como um fato da vida — e não apenas como o fim de tudo — quando nos damos conta de que somos vulneráveis e frágeis e de que o mundo (que inclui a figura do outro) também o é.
Eis o que chamo de interfragilidade. Para chegar a ela, é preciso percorrer três planos: a) primeiro, a fase de prevalência do ego, com sua mão fechada, pronta para o soco, ou então crispada sobre e empunhadura da espada; b) a seguir surge a etapa da mão aberta e estendida, que resulta do trabalho sobre a dimensão egóica; c) por fim vem a mão estendida, que se continua por um braço, que por sua vez se alia a outro e ambos se dispõem a abraçar.
Os braços pertencem a um corpo. No estado atual de nossa cultura, este é comandado pelas determinações do ego não trabalhado, que precisa dele para utilizá-lo como arma ou ferramenta, dado que é assim que exerce a competição e a agressividade. O ego “possui” o corpo, e essa relação dividida transforma a vida das pessoas em uma sucessão de apegos, disputas e conflitos.
Já a experiência do ego trabalhado muda esse horizonte, porque torna-se claro que não possuímos o nosso corpo: nós o somos. Entendida dessa forma, a corporeidade passa a ser vivida como uma intercorporeidade — e assim nos damos conta de que o corpo é o lugar onde se fundem o morador e a morada, a teoria e a prática, o abstrato e o concreto, o ser e o nada.
Da intercorporeidade emerge a espiritualidade. Esta, como escrevi antes, corresponde a uma atitude de respeito pelo mundo natural e participação em seus processos. Tudo isso começa, é claro, pela relação com o outro. Não estou dizendo que não se deva buscar por outros meios a transcendência, mesmo porque esta é uma dimensão necessária e fundamental para o ser humano. O ponto no qual insisto é que nenhuma iniciativa de religação pode ser tomada sem que primeiro se chegue ao ponto mais importante de todo o processo, que é a legitimação da figura do outro.
Se a busca do outro é a procura da integração no mundo, dizer que o amor é uma dimensão biológica só na aparência é uma redução. Uma reflexão mais aprofundada revela que apenas por meio do outro é possível ampliar e transcender as limitações de nossa fragmentação e solidão existencial.
A busca da alteridade é inerente à condição humana. Já sabemos que a localização anatômica de nossos olhos revela que eles estão orientados para enxergar o outro. Também não podemos abraçar a nós mesmos: só o outro pode abraçar-nos. Eis por que precisamos dele: para que nos abrace e assim nos ajude a saber que existimos.
Somos seres desejantes. Mas, como intuiu o psicanalista W. Fairbairn, a finalidade do desejo não é o prazer e sim a relação com o outro. O prazer é um meio para esse fim. Não buscamos a convivência por causa do prazer — é ele que nos leva a procurá-la. O si-mesmo não é apenas único, é também coletivo. Nesse sentido, o indivíduo não tem primazia sobre a cultura em que vive. Quanto mais nos identificarmos apenas com o ego, mais dificuldade teremos de entender que o si-mesmo é a um só tempo individual e comunitário.
Já em 1953, o escritor argentino Ernesto Sábato15, certamente influenciado por Martin Buber, via no processo histórico um impulso em direção ao feminino, ao qual chamou de gamocentrismo. Esse abraço dos sexos pode ser visto como uma metáfora para exprimir a complementaridade dos pensamentos linear e sistêmico, que compõe o pensamento complexo, o qual por sua vez permite o entendimento e a prática da visão de mundo neomatrística. Para Sábato as sociedades humanas se movem, desde a Idade Média, segundo a seguinte dinâmica:
- Comunidade medieval (predomínio do Nós);
- individualismo mercantil do Renascimento (predomínio do Eu);
- ciência e capitalismo abstratos da modernidade (predomínio do Isso);
- rebelião romântica, existencial, concreta e feminina (predomínio do Eu);
- síntese fenomenológica, rumo a uma comunidade feminino-masculina
(predomínio do Nós).
Neste ponto, é necessário fazer uma digressão. Sabemos que o início da experiência mental é inconsciente e se estrutura com o feto no útero materno, imerso em seu pequeno mar de líquido amniótico. Nesse ambiente ele está em paz, satisfeito e em “união oceânica” com a mãe, como escreveu Freud. Ao determinar a expulsão brusca da criança dessa “oceanidade”, o nascimento representaria um trauma terrível. É dessa separação que se originaram mitos conhecidos, como o da queda e o que fala de uma idade de ouro há muito perdida.
Nessa ordem de idéias, a partir do nascimento o ser humano se vê diante de dois caminhos: ou supera o trauma primal e torna-se um indivíduo no mundo, ou o nega e sua vida passa a ser uma longa jornada de volta à unidade perdida. No segundo caso, tem-se o que ocorre com certos místicos, para os quais a busca de uma fusão com o Universo significa a negação da existência individual — julgada insignificante — e uma idealização da religação com o todo.
Essa posição tem sido interpretada por muitos como alienante. Em termos psicológicos, corresponde a uma renúncia radical ao ego, que por sua vez tem sido vista como uma alternativa a ter que enfrentar o terror de sentir-se abandonado num mundo estranho e hostil. Para outros, ela também representaria uma necessidade de onipotência, cujo resultado mais imediato seria um certo desprezo por tudo o que é material.
O desejo narcísico de diluição na totalidade pode também ser interpretado como a raiz de nossa tendência de achar que pouco ou nada podemos fazer por nós próprios, o que nos levaria a buscar apoio em âmbitos abstratos e idealizados. Como resultado, nossos semelhantes passariam a ser encarados como fracos e desprezíveis ou, na melhor das hipóteses, como companheiros de infortúnio. Tenderíamos a transferir o nosso centro de auto-regulação para um domínio externo, o que acabaria nos alienando cada vez mais da realidade.
É muito importante não confundir a necessidade de ser visto (reconhecido) e abraçado (acolhido) pelo outro com o desejo de retornar a essa “oceanidade”. Abraçar e ser abraçado derivam da primeira escolha atrás mencionada, isto é, da opção de tornar-se um indivíduo neste mundo. Sustento que ver e ser visto, tocar e ser tocado, abraçar e ser abraçado (pelo outro e pelo mundo) são metáforas de integração, não de diluição ou apagamento.
A religação de que fala o pensamento complexo é uma reaproximação de saberes, a ser posta em prática na concretude dos sistemas da natureza. Não se trata de uma vontade de retorno, mas sim de uma efetiva participação na dinâmica dos ciclos do mundo natural. É uma interdependência espontânea, que produz autoprodução e autonomia, e não uma co-dependência induzida pelo medo, que resulta em aprisionamento.
Foi dito e repetido que a negação radical do ego, ou sua transformação em vilão, traz consigo o perigo de alienação e, em conseqüência, a negação do outro. A suposição, por exemplo, de que a ancestral cultura matrística seria um reino encantado, um grande útero materno ao qual todos devemos retornar, é um equívoco que, em última análise, traduz o desejo de submissão a um matriarcado ideal, que nada tem a ver com o modo matrístico de convivência.
Por isso, é necessário que não confundamos as atuais propostas de sociedades de parceria com fantasias de regressão a uma idade de ouro perdida. Essas iniciativas incorporam várias das características da cultura matrística, mas a consciência que as orienta está baseada em uma visão de futuro realista, e nada receosa ou submissa.
Do mesmo modo, o pensamento complexo está muito longe dessa idéia de fusão “oceânica”. Sua proposta inclui a procura do autoconhecimento, que resulta da compreensão de que o ego é frágil e por isso precisa ser trabalhado e reestruturado, para que possa ser capaz de cumprir o seu papel. Um ego frágil, alienado ou negado em nada ajudará na reforma do sistema de pensamento.
O eu contém o múltiplo (a sociedade, a cultura), que por sua vez o contém. Eis a unitas multiplex — a unidade na multiplicidade, a tradução do abraço comunitário que envolve a cada um de nós. Tudo isso se expressa de um modo dinâmico: o eu se transforma com a cultura, que por sua vez o modifica, numa relação de congruência. O abraço não é um substantivo, e sim um verbo — um verbo no gerúndio: melhor seria que estivéssemos sempre abraçando e nos deixando abraçar.
A insistência em negar essa necessidade gera a interminável seqüência das nossas aflições. Fingimos não saber que quanto mais “competitividade” mais esperteza e menos inteligência. A esperteza fragmenta, mutila, não respeita a unidade das coisas naturais. A inteligência aproxima, abraça. Não pode ser medida, porque sua única dimensão é a totalidade.
Não é que a inteligência seja melhor do que a esperteza, nem vice versa. Vejo as duas do ponto de vista operacional — e afirmo que elas não precisam complementar-se, porque a primeira já inclui a segunda, isto é, o homem inteligente é aquele que sabe que, no fluxo das coisas, é preciso ser inteligente sem deixar de ser esperto. Sabe que é necessário temperar a habilidade de resolver problemas mecânico-fisiológicos com os limites éticos que a inteligência aponta para as conseqüências das ações que os geraram.
A “competitividade” é uma dimensão da esperteza. A competência está no âmbito da inteligência. Dizer que precisamos trabalhar por mais inteligência e menos esperteza equivale a propor que é necessário buscar mais individualidade e menos individualismo. A individualidade é o ponto de partida natural para a interpessoalidade. O individualismo é o marco inicial da competição predatória. O homem que se individualiza é aquele que se diferencia da massa, mas não imagina que pode se isolar de seus semelhantes. É o que se torna indivíduo sem se deixar alienar.
Não há, pois, individualidade sem interpessoalidade. Ser indivíduo é buscar a inteligência (que nasce da interpessoalidade) e saber lidar com a esperteza (que se origina no individualismo). Não nos esqueçamos de que o homem que se torna um indivíduo é uma síntese viva e criadora da condição humana, enquanto que aquele que mergulha no individualismo imagina-se sempre primeiro e único o que, como já foi dito, equivale a correr o risco de ser também o último.
Esperteza (“competitividade”) é querer vencer eliminando os vencidos. Inteligência (competência) é poder vencê-los e estender-lhes a mão, para que eles possam amanhã ser também vencedores. A mão fechada é o começo da separação. A mão estendida é o início do abraço. É o ponto de partida para o pensamento complexo — marco inaugural do longo processo de busca da solidariedade.
Notas
1. SENGE, Peter, et al. The Fifth Discipline Fieldbook. Nova York: Doubleday Currency, 1994, p.p. 3-4.
2. PESSOA, Fernando. Obra Poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1974, p. 212.
3. Id., ibid., p. 217.
4. MARIOTTI, Humberto. As Paixões do Ego: Complexidade, Política e Solidariedade. São Paulo: Palas Athena, 2000, pp. 245-246.
5.PESSOA, Fernando. Obra Poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1974, p.207.
6.Id., ibid., p. 207.
7.Id. ibid., p. 222.
8.Id., ibid., p. 234.
9.Id., ibid., p. 238.
10. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou da Educação. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992, pág. 9, nota 1.
11. MONTAGU, Ashley A Superioridade Natural da Mulher. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970, p. 3.
12. Ver TODOROV, Tzvetan. A Vida em Comum: Ensaio de Antropologia Geral. Campinas (S. Paulo): Papirus, 1996, pp. 24-25.
13. MONTAGU, op. cit., p. 138.
14. SHAKESPEARE, William. The Complete Works of William Shakespeare. (William G. Clark, William A. Wright, eds.) Nova York: Grosset & Dunlap, 1911, Love’s Labour’s Lost, p. 182.
15. SÁBATO, Ernesto. Heterodoxia. Campinas (S. Paulo): Papirus, 1993, p.91.
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( © Mariotti, H., 2002 )
Observação. Este texto corresponde a uma palestra dada pelo autor nas 3as. Conferências Internacionais de Epistemologia e Filosofia. Instituto Piaget, Campus Acadêmico de Viseu, Portugal, em abril de 2002.
HUMBERTO MARIOTTI Médico psicoterapeuta. Professor e coordenador do Centro de Desenvolvimento de Lideranças da Business School São Paulo (SP). Coordenador do Grupo de Estudos de Pensamento Complexo Aplicado à Administração e aos Negócios da Business School São Paulo.
Email- homariot@uol.com.br
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