Camaradas!
Caso os camaradas queiram fazer alguma crítica, no final de cada artigo tem um link-comentários.
Boa leitura e um abraço fraterno a todos.
Runildo Pinto
, por Nahuel Moreno
Parte I
Apresentação
Neste caderno reproduzimos o documento "Moral Bolche ou Espontaneísta?", mais conhecido como "Documento de Moral". Moreno escreveu este material em 1969, quando voltou à Argentina depois de estar preso no Peru. Quando voltou, encontrou no partido argentino uma situação de relaxamento nas normas morais, com manifestações concretas que afetavam o desenvolvimento da organização e de seus militantes.
Preocupado, Moreno resolveu sistematizar os princípios marxistas relativos à moral, ou seja, às normas de comportamento individual. Se levamos em consideração que a Argentina tinha entrado, poucos meses antes, em uma situação pré-revolucionária e que o partido tinha que elaborar urgentemente sua política e sua atividade frente às novas circunstâncias, o fato de que Moreno assumisse mais uma tarefa além das muitas que tinha por fazer demonstra a importância que dava à formação partidária e à necessidade de que os quadros e militantes tivessem critérios claros nesse terreno.
O texto que publicamos pela primeira vez em português, começa com uma análise do problema moral em geral: que é a moral, como sistema de normas que respondem a um determinado tipo de sociedade e que mudam historicamente. Analisa os diversos tipos de moral que existem nesta etapa de decadência da sociedade capitalista: a moral burguesa, a moral lumpen e a moral espontaneísta, que expressa a rebeldia pequeno-burguesa contra a moral tradicional burguesa e se aproxima da moral lumpen.
Estas considerações mais gerais abrem o caminho para desenvolver o que é mais importante no documento: definir qual é nossa moral, a moral dos socialistas revolucionários. O marxismo não estabelece normas rígidas de comportamento pessoal, o partido respeita a vida pessoal. Mas tem, sim, um critério rígido, dado pelo objetivo pelo qual entramos no partido e militamos nele: construí-lo como ferramenta para fazer a revolução operária. "Nossa moral, diz Moreno, é uma moral para uma luta implacável para derrotar um inimigo não menos implacável, os exploradores e o imperialismo". Aqui recordamos as palavras de Lenine:
"A vitória sobre a burguesia é impossível sem uma guerra prolongada, tenaz, desesperada, a morte; uma guerra que requer serenidade, disciplina, firmeza, inflexibilidade e vontade única". Essas condições indispensáveis para a vitória devem ser o alicerce sobre o qual construímos nossas normas de conduta.
Moreno esclarece que:
"nossa moral não ignora, e não poderia ignorar porque é uma parte importante da realidade, as necessidades biológicas ou culturais, ou do desenvolvimento individual, nem a liberdade e o prazer, mas exige que estejam subordinados e sejam assimiladas em função de nossas normas morais, que têm seu objetivo central: a revolução e o partido".
Colocar o partido como eixo da conduta moral tem uma conseqüência muito concreta e humana: a relação com os companheiros de luta, os camaradas do partido:
"a vida, a moral, a consciência e o próprio corpo físico do camarada de partido valem muito mais que si mesmo". "Não há, nem pode haver, sacrifício que não possamos fazer em favor do camarada". "Apesar de que, na mais ampla maioria, os companheiros não se conhecem entre si, as obrigações morais continuam existindo e não são menos necessárias; são companheiros e basta".
No relacionamento entre camaradas deve existir um respeito e uma confiança mútuos, que surgem do fato de que temos em comum a tarefa mais importante de nossa vida e de que, sempre perseguidos pelo estado, os burocratas e os reformistas, só poderemos nos apoiar uns nos outros. A segurança e a própria vida de cada um esta nas mãos de seus companheiros. É por isso também que nas questões de moral partidária e revolucionária, somos implacáveis: porque não aceitamos pôr em risco a organização e cada um de seus militantes por causa do comportamento irresponsável de alguns deles.
Por isso, o partido não só tem uma moral, como tem também uma disciplina e sanciona os que a violam ou cometem atos de traição contra a classe ou o partido. As pressões de classe, dos aparatos contra-revolucionários e do reformismo (que expressam, todas elas, as pressões da sociedade capitalista dentro do partido) provocam desvios mais ou menos graves em nossas fileiras. Como dizia Lenine:
"O capitalismo morto apodrece, se decompõe entre nós, infectando o ar com seus vírus e envenenando nossa vida: o que é velho, podre e morto se agarra, com milhares de vínculos e ataduras, a tudo o que é novo, fresco e vivo".
Isto, que Lenine assinalava em relação ao estado operário soviético, onde os capitalistas já tinham sido expropriados, é mil vezes mais valido entre nós, que estamos submersos no sistema capitalista. Só podemos enfrentar esse perigo permanente com critérios morais firmes, colocando sempre as necessidades da classe, da revolução e da organização por cima de toda consideração pessoal. E, além desse controle que cada um deve exercer sobre si mesmo, tem que estar o controle coletivo da disciplina partidária, que a ferramenta que garante que possamos atuar como um só homem e evitar que o comportamento individual de alguém prejudique a tarefa comum.
Vivemos em uma época de combate, que exige de nós disposição para o esforço, para o sacrifício e para a renúncia a desejos e gostos pessoais. Devemos adotar como nossas as palavras com que o partido bolchevique recrutava militantes durante a guerra civil na Rússia:
"Venha ao partido que não lhe promete privilégios nem vantagens. Se alcançarmos a vitória, construiremos um mundo novo. Se formos derrotados, lutaremos até o último homem".
Não queremos nos estender mais, pois o texto de Moreno é suficientemente claro. Só falta esclarecer um fato histórico que demonstra a utilidade que a discussão deste documento teve para o partido argentino. No último capitulo, Moreno expressa sua preocupação de que as faltas morais que observou pudessem produzir (e apontava sintomas disso) um enfraquecimento da atitude dos militantes diante da repressão. Alguns anos depois que o "Documento de moral" foi distribuído e discutido em todo o partido, a Argentina entrou na noite da barbárie fascista. A firmeza de nossos companheiros foi exemplar. Nossos desaparecidos morreram sem abrir um nome ou um endereço; nossos presos, em sua imensa maioria, suportaram as torturas sem entregar um só dado e mantiveram na prisão uma conduta moral que lhes valeu o respeito dos próprios repressores e de nossos adversários políticos. O partido continuou militando em meio às maiores dificuldades, passou a prova e assim, pôde (depois da queda da ditadura) voltar atividade legal ainda com mais força que antes.
Trotsky disse:
"Combatemos em nome do maior bem da Humanidade, em nome de sua regeneração, para tira-la das sombras e da escravidão". Essa é uma tarefa grandiosa que justifica a dedicação de nossa vida e a adoção de um comportamento individual de acordo com as necessidades da luta. Neste terreno, os ensinamentos deixados por Moreno vão mais alem deste documento; estão contidos, principalmente, no exemplo de sua vida militante.
Francisco Morais
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