“Estamos há dez anos vivendo nestas montanhas, preparando-nos para fazer aguerra. Dentro destas montanhas construímos um exército.
Antes, nas cidades e nas fazendas, nós não existíamos.Nossas vidas valiam menos que as máquinas e os animais.
Éramos como pedras. Como plantas que existiam pelos caminhos.Não tínhamos palavra.
Não tínhamos rosto.
Não tínhamos nome.
Não tínhamos manhã.
Nós não existíamos.
Para o poder, este que hoje é conhecido mundialmente com o nome de neoliberalismo, nós não contávamos. Não produzíamos, não comprávamos, não vendíamos.
Então, nós fomos para a montanha para buscar o bem e ver se encontrávamos alívio para a nossa dor de ser pedras e plantas esquecidas.
Aqui, nas montanhas do sudeste mexicano, vivem nossos mortos. Muitas coisas sabem nossos mortos que vivem nas montanhas.
Sua morte falou conosco e nós escutamos.
Caixinhas que falam nos contaram outra história que vem de ontem a aponta para o amanhã.
Falou conosco a montanha, os macehualob, que somos pessoas simples e comuns.
Somos gente simples, assim como nos chamam os poderosos.
Todos os dias e noites que arrastam, o poderoso quer nos fazer bailar o X-Tol e repetir sua brutal conquista.
O Kaz-Dzul, o homem falso, governa nossas terras e tem grandes máquinas de guerra que, como o Boob, que é metade puma e metade cavalo, reparte dor e morte entre nós.
O falso governo manda-nos os Aluxob, mentirosos que enganam e dão de presente o esquecimento para a nossa gente.
Por isso nos tornamos soldados.
Por isso continuamos sendo soldados.
Por isso não queremos mais morte e engano para os nossos, porque não queremos o esquecimento.
A montanha nos mandou tomar as armas para poder assim ter voz.
Mandou-nos cobrir o rosto para assim ter rosto.
Mandou-nos esquecer nosso nome para assim sermos nomeados.
Mandou-nos guardar nosso passado para assim ter amanhã.
Na montanha vivem os mortos, nossos mortos.
Como eles vivem Votán e Ikal, a luz e as trevas, o úmido e o seco, a terra e o vento, a chuva e o fogo.
A montanha é a casa de Halach Uinic, o homem verdadeiro, o grande chefe.
Lá aprendemos e lá recordamos que somos o que somos, os homens e as mulheres verdadeiros.”
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