Crédito: bp.blogspot | |
Reproduzimos abaixo o conjunto de textos organizado na publicação
"O Lula secreto", pelo blogueiro Hugo Studart, no Internacional Press -
Informação independente do Brasil e do mundo
(http://internacionalpress.wordpress.com).
O conteúdo pode ser originalmente encontrado em: http://internacionalpress.wordpress.com/2011/01/09/o-lula-secreto/
Segue coletânea de artigos sobre o já mítico presidente Lula.
Mário Garnero, testa de ferro do Barão Rothschild no Brasil conta sobre o “Lula Secreto”
Mistério (e suspeita) na gênese desse lider politico
“Um dos grandes mistérios da história
politica brasileira é compreender por que, afinal, os próceres do regime
militar deixaram um jovem e desconhecido metalúrgico Luís Inácio da
Silva, sem origem partidária e sem referência, sem grandes articulações,
de repente se transformar em grande líder. Lula tem estrela? Sorte? É
um predestinado? Ou teria sido construído, meticulosamente, nos arquivos
secretos da ditadura? Fala-se inclusive, entre os militares da
repressão, que Lula seria invenção do general Golbery do Couto e Silva,
em armação com o empresário Mario Garnero. Será? Esta última
possibilidade, a de haver um “Lula Secreto”, sempre foi aventada, mas
nunca provada.
Recebi tempos atrás (de Alfredo Pereira
dos Santos) cópia do capitulo de um livro de autoria do próprio Mário
Garnero, “JOGO DURO”, relatando sua relação com Lula nos anos 70. O
livro, já esgotado, foi editado pela Best Seller em 1988. O depoimento
em questão vai da página 130 à 135. “Alguém já estranhou o fato do Lula
jamais ter contestado o que o Garnero disse no livro nem tê-lo
processado?”, indaga Alfredo Pereira Santos, autor da digitalização do
trecho. Seria essa recusa decorrente da afirmação do próprio Garnero,
segundo a qual…
“Longe de mim querer acusá-lo de ser o
Cabo Anselmo do ABC, mesmo porque, ao contrário do que ocorre com o
próprio Lula, eu só acuso com as devidas provas. Só me reservo o direito
de achar estranho” (…) “Lula foi a peça sindical na estratégia de
distensão tramada pelo Golbery – o que não sei dizer é se Lula sabia ou
não sabia que estava desempenhando esse papel”, escreve ainda Garnero.
Procurei o próprio Mário Garnero para
conversar sobre o assunto. Ele me recebeu com toda deferência, na sede
do Brazilinvest, na av. Faria Lima, São Paulo. Em almoço com talheres de
prata. “Não quero mais falar sobre isso”, desconversou Garnero. Sobre o
livro, ele disse que já passou, que os tempos são outros (escreveu-o
depois de ser preso, quando ainda guardava muitas mágoas), e que hoje
não tem qualquer intenção de ressuscitar o assunto. Insisti daqui,
perguntei das mais diversas formas. Sempre muito gentil, nada de novo
informou. Mas o essencial está registrado em livro. Fiquem com o
depoimento do Garnero, vale à pena ler até o fim e a fim de tirar as
próprias conclusões.”
Um dos motivos para a recusa de Garnero
em comentar o assunto pode se dar ao fato de que quase 20 anos depois de
ter sido banido do mercado financeiro, Mário Garnero voltou ao centro
do poder abraçado ao governo Lula. À frente dos presidentes do Senado,
José Sarney, e do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, dos ministros
Dilma Rousseff e Ciro Gomes e de sete governadores, foi anfitrião das
autoridades e dos 300 empresários presentes em seminário no ano de 2004.
Foi em 2002 que Garnero entrou em ação e
ofereceu seus serviços para aproximar o PT e os banqueiros
internacionais. Uma resposta ao tal “lulometro”, um índice de
desconfiança do capital estrangeiro com a possível eleição de Lula a
presidência.
Garnero até articulou uma viagem de José
Dirceu aos Estados Unidos que incluiu desde palestras para investidores
no banco Morgan Stanley até visitas a gabinetes de altos funcionários
em plena Casa Branca.
Eis a transcrição de seu livro de 1988:
“Eu me vi obrigado, no final do ano
passado, a enviar um bilhetinho pessoal a um velho conhecido, dos tempos
das jornadas sindicais do ABC. Esse meu conhecido tinha ido a um
programa de tevê e, de passagem, fez comentários a meu respeito e sobre o
Brasilinvest que não correspondem à verdade e não fazem jus à sua
inteligência.
Sentei e escrevi: “Lula…” Achei que
tinha suficiente intimidade para chamá-lo assim, embora, no envelope,
dirigido ao Congresso Nacional, em Brasília, eu tenha endereçado,
solenemente: “A Sua Excelência, Sr. Luiz Ignácio Lula da Silva”. Espero
que o portador o tenha reconhecido, por trás daquelas barbas.
No bilhete, tentei recordar ao
constituinte mais votado de São Paulo duas ou três coisas do passado,
que dizem respeito ao mais ativo líder metalúrgico de São Bernardo: ele
próprio, o Lula. Não sei como o nobre parlamentar, investido de novas
preocupações, anda de memória. Não custa, portanto, lembrar-lhe. É uma
preocupação justificável, pois o grande líder da esquerda brasileira
costuma se esquecer, por exemplo, de que esteve recebendo lições de
sindicalismo da Johns Hopkins University,
nos Estados Unidos, ali por 1972, 1973, como vim a saber lá, um dia. Na
universidade americana até hoje todos se lembram de um certo Lula com
enorme carinho.
Além dos fatos que passarei a narrar,
sinto-me no direito de externar minha estranheza quanto à facilidade com
que se procedeu à ascensão irresistível de Lula, nos anos 70, época em
que outros adversários do governo, às vezes muito mais inofensivos,
foram tratados com impiedade. Lula, não – foi em frente, progrediu.
Longe de mim querer acusá-lo de ser o Cabo Anselmo do ABC, mesmo porque,
ao contrário do que ocorre com o próprio Lula, eu só acuso com as
devidas provas. Só me reservo o direito de achar estranho..
Lembro-me do primeiro Lula, lá por 1976,
sendo apresentado por seu patrão Paulo Villares ao Werner Jessen, da
Mercedes-Benz, e, de repente, eis que aparece o tal Lula à frente da
primeira greve que houve na indústria automobilística durante o regime
militar, ele que até então era apenas o amigo do Paulo Villares, seu
patrão. Recordo-me de a imprensa cobrir Lula de elogios, estimulando-o,
num momento em que a distensão apenas começava, e de um episódio que é
capaz de deixar qualquer um, mesmo os desatentos, com um pé atrás.
Foi em 1978, início do mês de maio. Os
metalúrgicos tinham cruzado os braços, a indústria automobilística
estava parada e nós, em Brasília, em nome da Anfavea , conversando com o
governo sobre o que fazer. Era manhã de domingo e estive com o ministro
Mário Henrique Simonsen. Ele estivera com o presidente Geisel, que
recomendou moderação: tentar negociar com os grevistas, sem alarido.
Imagine: era um passo que nenhum governo militar jamais dera, o da
negociação com operários em greve. Geisel devia ter alguma coisa a mais
na cabeça. Ele e, tenho certeza, o ministro Golbery.
Simonsen apenas comentou, de passagem,
que Geisel tinha recomendado que Lula não falasse naquela noite na
televisão, como estava programado. Ele era o convidado do programa Vox
Populi, que ia ao ar na TV Cultura-o canal semi-oficial do governo de
São Paulo. Seria uma situação melindrosa. “Nem ele, nem ninguém mais que
fale em greve”, ordenou Geisel.
Saí de Brasília naquela manhã mesmo,
reconfortado pela notícia de que ao governo interessava negociar. Desci
no Rio com as malas e me preparei para embarcar naquela noite para uma
longa viagem de negócios que começava nos Estados Unidos e terminava no
Japão. Saí de Brasília também com a informação de que Lula não ia ao ar
naquela noite.
Mas foi, e, no auge da conflagração
grevista, disse o que queria dizer, numa televisão sustentada pelo
governo estadual. Fiquei sabendo da surpreendente reviravolta da
história num telefonema que dei dos Estados Unidos, no dia seguinte.
Senti, ali, o dedo do general Golbery. Mais tarde, tive condições de
reconstituir melhor o episódio e apurei que Lula só foi ao ar naquele
domingo porque no vai-não-vai que precedeu o programa, até uma hora e
meia antes do horário, prevaleceu a opinião de Golbery, que achava
importante, por alguma razão, que Lula aparecesse no vídeo. O general
Dilermando Monteiro, comandante do II Exército, aceitou a argumentação, e
o governador Paulo Egydio Martins, instrumentado pelo Planalto, deu o nihil obstat final ao Vox Populi.
Lula foi a peça sindical na estratégia
de distensão tramada pelo Golbery – o que não sei dizer é se Lula sabia
ou não sabia que estava desempenhando esse papel. Só isso pode explicar
que, naquele mesmo ano, o governo Geisel tenha cassado o deputado
Alencar Furtado, que falou uma ou outra besteira, e uns políticos
inofensivos de Santos, e tenha poupado o Lula, que levantava a massa em
São Bernardo. É provável que, no ABC, o governo quisesse experimentar,
de fato, a distensão. Lula fez a sua parte.
Mais tarde, ele chegou a ser preso,
julgado pelo Supremo Tribunal Federal, enfrentou a ameaça de
helicópteros do Exército voando rasantes sobre o estádio de Vila
Euclides, mas tenho um outro testemunho pessoal que demonstra o
tratamento respeitoso, eu diria quase especial, conferido pelo governo
Geisel ao Lula- por governo Geisel eu entendo, particularmente, o
general Golbery. Dois ex-ministros do Trabalho- Almir Pazzianotto e
Murilo Macedo – podem dar fé ao que vou narrar.
Aí, já estávamos na greve de 1979, que
foi especialmente tumultuada. O movimento se prolongava, a indústria
estava parada havia quinze dias, e todos nós, exaustos, empresários e
trabalhadores, tentávamos uma solução. Marcamos, no fim de semana, uma
reunião na casa do ministro do Trabalho, Murilo Macedo, aqui em São
Paulo.
Domingo , 8 da noite. O ministro, mais o
Theobaldo de Nigris, presidente da Fiesp, dois ou três representantes
de sindicatos patronais, eu, pela indústria automobilística, e a
diretoria dos três sindicatos operários, o de São Bernardo, o de São
Caetano e o de Santo André. Reunião sigilosa. Coisas do Brasil: como era
um encontro reservado, a imprensa ficou sabendo. Chegou antes de nós.
Muita tensão, muito cansaço. E como o
uísque do ministro era generoso, por volta das 2 da manhã tivemos a
primeira queda. Literalmente, desabou sobre a mesa de negociações o
deputado federal Benedito Marcílio, presidente do Sindicato de São
Caetano, continuamos sem ele. Por volta das 4 e meia da madrugada ,
fechamos o acordo com Lula e com o outro (Pazzianotto servia como
assessor jurídico do Sindicato de São Bernardo). Saem todos. Lula assume
o compromisso de ir direto para a assembléia permanente em Vila
Euclides, e desmobilizar a greve. O ministro do Trabalho, aliviado,
ainda teve tempo de confidenciar: “Olha, se não saísse esse acordo,
teria intervenção nos sindicatos”. Fomos dormir.
Quando acordei, disposto a saborear os
frutos do trabalhoso entendimento, sou informado de que, de fato, Lula
tinha ido direto para a assembléia. Como prometera. Chegou lá e botou
fogo na massa. A greve iria continuar. Acho difícil que ele tenha feito
de má fé. Sujeito maleável, sensível, ele deve ter percebido que o seu
poder de persuasão sobre a assembléia não era tão amplo assim. Cedeu.
Mesmo sabendo que as conseqüências se voltariam contra ele, como havia
dito o ministro Murilo Macedo: intervenção no sindicato, ele afastado.
Foi o que se deu.
Gostaria de lembrar ao Lula – que me
trata como um desafeto – que sua volta ao sindicato, em 1979, começou a
acontecer num escritório da Avenida Faria Lima, número 888, um dia
depois da intervenção decretada. Ocorre que esse escritório era o meu e
que ainda guardo uma imagem bastante nítida do Lula e do Almir
Pazzianotto, sentadinhos nesse mesmo sofá que eu ainda tenho sob meus
olhos, enquanto eu ligava alternadamente para o Murilo Macedo e para o
Mário Henrique Simonsen, em Brasília.
- Se a intervenção acabar no ato, eu paro a greve – dizia Lula.
Eu transmitia o recado aos dois ministros que negociavam em nome do governo.
- Não é possível, o governo não pode
fazer isso. Pára a greve que, em quinze, vinte dias, o sindicato estará
livre – me respondiam, de Brasília.
Lula foi cedendo, aconselhado pelo Pazzianotto. Mas o acordo empacou num ponto:
- Como é que vou lá propor isso à
peãozada, se não tenho nenhuma garantia de que o governo vai cumprir a
promessa de acabar com a intervenção? – observou ele, cauteloso.
Confesso que também empaquei. Mas decidi arriscar:
- E se for eu o fiador? – perguntei. Era a única garantia que poderia oferecer.
- Como assim? – quis saber Pazzianotto.
- O seguinte: se o Lula não voltar ao
sindicato, eu, na qualidade de presidente da Anfavea, vou ao público e
conto esta história, dizendo que eu também fui ludibriado. Entro nisso
com vocês.
Lula pensou um minuto:
- Aceito.
Liguei para o ministro Simonsen, para o
Murilo Macedo, e, depois, para o Golbery, que prometeu: “Nós suspendemos
a intervenção dentro de um mês e ele volta”.
A greve terminou. A intervenção foi
suspensa em dez dias. Lula voltou à presidência do Sindicato de
Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, para se preparar para vôos mais
ambiciosos, que eu ainda acompanho, à distância, com bastante interesse.
No programa de tevê que citei, Lula
reclamava de o Brasilinvest não ter pago seus débitos. O Brasilinvest
nunca deveu aos trabalhadores, nem aos contribuintes brasileiros.
Naquele momento em que Lula falava, os únicos credores com os quais os
Brasilinvest ainda não tinha resolvido todas as suas pendências eram uns
poucos bancos estrangeiros. Curioso que o presidente do Partido dos Trabalhadores tomasse as dores de banqueiros internacionais.“
Dora Kramer fragmento de artigo publicado no Jornal do Brasil, 18 de agosto de 2004:
“O sindicalista Lula – ao contrário do
que parece - não se absteve de estudar. Há relatos – nunca desmentidos –
de sua preparação em cursos de AFL CIO, as centrais sindicais
norte-americanas, quintessência do peleguismo e do anti-esquerdismo em
geral e na John Hopkins University, em Baltimore, Estados Unidos (em
1972 ou 73), onde teria feito um curso de liderança sindical, desenhado
sob medida para parecer de esquerda, apenas parecer, mas servir ao
sistema dominante. Merece um doutorado honoris causa, ou seria horroris
causa? E, além disso, já como diretor do sindicato dos Metalúrgicos,
cursou o Instituto Interamericano para o Sindicalismo Livre, (Iadesil),
sustentado pela CIA e passou a adotar sua própria “agenda”, livrando-se
do próprio irmão, o Frei Chico, quadro do Partido Comunista.”
Da entrevista do ex-deputado Sinval Boaventura ao Jornal Opção na edição de 22 a 28 de janeiro de 2006. (Foto: Golbery)
“Repórter: É verdadeira a
história de uma reunião na casa do então deputado Simões da Cunha, na
qual a deputada Ivete Vargas teria contado que saíra de um encontro com o
general Golbery e este revelou que ia projetar o sindicalista Lula para
ser o anti-Brizola ?
Sinval Boaventura: A
Ivete Vargas* disse que tinha estado com o ministro Golbery, na chácara
dele, e que ele dissera que precisava trazer o Brizola para o Brasil,
porque ele estava se tornando um mito muito forte fora do país. Que era
melhor ele voltar e disputar eleição, porque assim perderia o prestigio
politico. Fui ao Golbery e ele confirmou a conversa com a Ivete.
Explicou que sua estratégia era estimular a imprensa para projetar o
Luiz Inácio da Silva, o Lula, um grande lider metalúrgico de São Paulo
como uma liderança inteligente expressiva, para ser preparado como o
anti-Brizola. Sou testemunha deste tese do general Golbery. “
*Ivete Vargas cujo marido trabalhava
para Golbery, em 1979 presidiu uma das facções que disputaram o
controle da sigla do PTB, com o grupo de Leonel Brizola, e finalmente,
em 1980, por decisão do TSE, ganhou a disputa, e se tornou a Presidente
Nacional do Novo PTB. Um novo PTB, governista, criado exclusivamente
para enfraquecer Brizola.
Da entrevista de Jarbas Passarinho de 2008 na Terra Magazine:
Terra Magazine – As vitórias de FHC e Lula, um intelectual e um operário, podem ser consideradas uma herança de 68?
Jarbas Passarinho – Do Fernando
Henrique, sim. Porque, como disse o Delfim (Netto), ele foi
auto-exilado. Ele saiu do Brasil como o Delfim dizia: com passaporte e
bagagem despachada (risos).
Mas é um julgamento suspeito. FHC e Delfim não se dão bem…
Tanto ele como o (José) Serra. Todos os
dois depois ficaram meus amigos. Esse (FHC) eu considero um subproduto
direto. O Lula, não. Lula pode constar como do Golbery (do Couto e
Silva, 1911-1987, general e fundador do SNI).
Golbery, por quê?
Golbery fez tudo para conquistar o Lula.
E a mudança de posição do próprio Figueiredo foi quando Lula começou a
fazer as greves. Entendia que ele fosse um êmulo de Gandhi, já que ele
não tinha lido o (Henry David) Thoreau, mestre da desobediência civil.
Ele não leu nada, então é isto. Mas Gandhi ele devia saber… Me lembro
quando ele deu uma declaração à TV, não aceitando a decisão do Tribunal
do Trabalho de São Paulo sobre a reposição salarial dos trabalhadores.
Lula disse: “Não reconheço esse tribunal”. Me lembro bem. Era
desobediência civil! Coloco bem diferente do resto, até porque a reação
dele já foi quando todas as liberdades fundamentais estavam
restabelecidas.
O senhor conversou com Golbery, alguma vez, sobre Lula?
Não. Minhas relações com Golbery foram
difíceis. No final, como eu faço muito no meu estilo, quando ele se
demitiu do governo, eu era ministro e fui visitá-lo. Aliás, fiquei
impressionado porque era um sítio cheio de animais, a esposa dele
gostava muito. E as estantes dele eram muito precárias do ponto de vista
da madeira. Mas eram enormes, um pavilhão inteiro de livros. Com a
vantagem de que eram livros que eu também tinha lido (risos). Ele não
comprava a coisa por metro.
O governo militar estimulou a liderança de Lula?
Creio que a política sindical é
tipicamente isso. Agora, cada vez mais, o líder sindical trabalha sempre
pra ter as melhorias imediatas. Aqui e agora. Saiu numa publicação aí
de São Paulo que os colegas do Lula ficaram decepcionados com as adesões
ao governo. Foi todo mundo pescar na represa Billings (risos). Lula, do
ponto de vista original, iludiu demais. E tem esse grupo da esquerda
burocrática, ao mesmo tempo uma esquerda suave, como a do intelectual
Fernando Henrique, que pediu pra esquecerem o que ele escreveu; porque o
mundo mudou. Realmente, mudou muita coisa. O Fernando Henrique, pra
chegar ao poder, veio apoiado pelo que hoje é o DEM.
‘Não sabia que Lula tinha derrotado os comunistas’
Em 1975, antes mesmo de tomar posse como governador, Paulo Egydio deu posse a Luiz Inácio Lula da Silva como presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo.
“Isso provocou uma reação da chamada
comunidade de informações”, diz. Geisel teria perguntado “o que deu na
cabeça” de Paulo Egydio. Ele explicou que Lula era adversário dos
comunistas. Geisel relaxou: “Mas eu não sabia que ele tinha derrotado os
comunistas”. Segundo Egydio, Golbery do Couto e Silva, da Casa Civil,
manobrou para “atrair” Lula para a política.
Brasil, 2008
“Na comemoração dos 60 anos do grupo pão
de açúcar [eu estive presente], a única coisa que se ouviu da ‘direita
conservadora’ é a união do Brasil grande com Lula.
Está se formando na elite empresarial brasileira um pensamento de que o Lula é um homem que a elite pode confiar com segurança.
Empresários, banqueiros e ruralistas
demonstraram ao Lula, pessoalmente, suas intenções e projetos de que o
PT continue no governo por mais 8 anos.
O empresário Abílio Dinis,
presidente do Grupo Pão de Açucar, foi pessoalmente se desculpar ao
Lula pelo seu seqüestro em 1989 atribuído ao Lula e ao PT (o pedido de
desculpa foi público). A imprensa de hoje já dá sinais de que o pedido
de desculpas foi aceito e que, agora, vão em frente como aliados
empresários e Lula.
O golpe que muitos temiam neste grupo da
resistência e de militares não virá da esquerda e sim da direita e das
elites corporativas.
Detalhe:
Havia muita gente da UDR e
dos frigoríficos de carne bovina [setor a que eu pertenço] presente no
encontro e todos, quase por unanimidade, estão embarcando neste projeto
de ‘Lula mais 8 anos’,[DILMA!] no maior e mais rico estado da federação.
Isto é um bom sinal do que poderá acontecer no futuro.
Rui Vicentini”
O que os empresários acham de Lula:
O mundo já deu tantas voltas nestes quase vinte anos que separam o seqüestro da festa dos Dinizque
o dono do Pão de Açúcar não apenas convida Lula para ser uma das
estrelas de seu jantar como lidera um grupo de empresários para um
projeto pós-2010 em torno do presidente. De acordo com um interlocutor
de Diniz, o grupo, do qual fariam parte também o empreiteiro Emílio
Odebrecht, da Odebrecht, e Beto Sicupira, da InBev
e amigo de Diniz, quer aproximar o presidente da gestão e do dia-a-dia
das grandes empresas brasileiras depois que ele deixar o cargo.
“Esse grupo de empresários critica o
hábito que os políticos brasileiros têm de deixar os cargos e fazer
cursos nos EUA, ficando lá como bobos, sem nem entender direito inglês”,
diz o amigo de Diniz. Eles acreditariam que Lula, mesmo tendo dirigido o
país por oito anos, ainda teria o que aprender com as empresas
brasileiras, muitas delas hoje multinacionais. A coluna tenta conversar
com Diniz sobre o “projeto Lula pós-2010″. Ele sorri. A coluna insiste. E
Diniz, sempre sorrindo: “Não posso comentar nada.”
O jantar do Pão de Açúcar reuniu tantos
empresários e autoridades, como os ministros Nelson Jobim, da Defesa, e
Dilma Roussef, da Casa Civil, entre outros -que foram mobilizados 30
agentes de segurança da Presidência da República, 20 batedores do
aeroporto até o local do jantar, 20 agentes do Pão de Açúcar e mais
seguranças da Casa Fasano para zelar pela tranqüilidade dos convidados.
Cerca de 200 funcionários do Fasano serviam guloseimas como tartare de
salmão envolto em papel de arroz, camarão em crosta de gergelim e
vieiras com perfume de gengibre sobre risoto de pistache, mini-folhado
de perdiz e papoula, vol-au-vent de camembert e damasco; para beber,
espumante Valentim, nacional, feito em homenagem ao patriarca do Pão de
Açúcar, Valentim Diniz, que morreu em março, aos 94 anos.
Lula já deu aos banqueiros 75 bilhões em duas semanas
O governo Lula já tirou mais de R$ 75
bilhões das reservas brasileiras, ou seja, dinheiro público, para
aliviar os bancos da falência
9 de outubro de 2008
Apesar da imunidade fictícia criada pelo
governo Lula, da interferência da crise financeira sobre o Brasil,
somente nas duas últimas semanas foram despejados nos cofres dos
banqueiros, nada mais, nada menos que R$ 75 bilhões. Este valor é o que
já foi entregue para conter as falências dos bancos privados, mas a
tendência é que a transferência de dinheiro público para os bancos seja
ainda maior, pois o governo está preparando novas medidas para dar
liberdade total para o Banco Central atuar na defesa incondicional de
bancos e instituições financeiras.
O governo está prevendo repasse de R$ 5
bilhões para o setor da Agricultura. São outros R$ 10 bilhões para o
Fundo da Marinha Mercante e R$ 15 bilhões a mais para o BNDES (Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) poder disponibilizar na
forma de linhas de crédito.
O governo tirou a obrigação dos bancos
de realizar os depósitos compulsórios, depósitos realizados no Banco
Central, diariamente, pelas instituições. Com esta isenção, os bancos
possuem mais dinheiro em caixa para assim evitar falta de liquidez. Foi
aumentada de R$ 100 milhões para R$ 300 milhões o valor que os bancos
podem deixar de depositar a título de depósito compulsório. Somente esta
medida fez com que os bancos tivessem à disposição para gastar, R$ 5,2
bilhões.
Ainda sobre os depósitos compulsórios o
governo deu aos bancos a isenção do depósito em 40% para os bancos que
comprarem carteiras de empréstimos de instituições que estiverem em
crise. Com esta medida serão repassados para os bancos, mais R$ 23,4
bilhões. Ainda há a medida que adia o prazo de aumento da alíquota do
depósito compulsório para as empresas que trabalham com leasing. Isso
elevou o montante em mais R$ 8 bilhões.
José de Souza Martins*
Quem viu as fotografias e leu o
noticiário sobre a visita do presidente Luiz Inácio a Palmeira dos
Índios, em Alagoas, deve ter estranhado exuberantes elogios (além da
carona no Aerolula) ao ex-presidente Collor, extensivos a Renan
Calheiros, que teve problemas na presidência do Senado. A que se pode
juntar os elogios e o empenhado apoio que nestes dias deu a José Sarney,
presidente do Senado, enrolado na questão dos atos secretos de
nomeações para funções naquela casa do Congresso.
REABILITAÇÃO – Em Alagoas, o presidente fala de Collor com ênfase, após lhe dar carona no Aerolula
O Lula e o PT de hoje são
irreconhecíveis em face do que disseram que seriam, no manifesto de
fundação do partido, em 1980. Eles se tornaram interessantes enigmas
para a compreensão dos nossos impasses políticos, os de uma história
política que avança recuando. Em discurso de 1980, na Escola Superior de
Guerra, o general Golbery do Couto e Silva, militar culto, ideólogo do
regime instaurado pelo golpe de Estado de 1964, deu indicações sobre a
armação do futuro político do País e do lugar que nele vislumbrara para
Lula. O discurso está centrado nos requisitos da segurança nacional e se
refere ao âmbito da liberdade política que romperia a dependência de
facções da oposição em relação à polarização da Guerra Fria.
Para ele, a redução da liberdade
política criara uma rede de organizações extrapolíticas de oposição ao
regime. A abertura se justificava como meio de fazer com que os partidos
renascessem “na plenitude de sua função de partidos”, para que a
política retornasse ao seu leito natural, forma de manter as oposições
divididas. Dedica umas poucas palavras à “ala esquerdista da Igreja”, e é
quando cita Lula enquanto membro de uma elite sindical de líderes
autênticos, “sem revanchismo ideológico”. Lula “poderia ter sido” um
desses líderes, diz Golbery, que se confessa desapontado com ele porque
fora atraído “para as atividades mais políticas do que propriamente
sindicais”.
Intuitivo e prático, tudo sugere que
Lula aos poucos compreendeu o plano de Golbery melhor do que o próprio
Golbery. Era evidente a orfandade das esquerdas, que culminaria com a
queda do Muro de Berlim no fim de 1989. No Brasil essa orfandade se
traduzia numa fragmentação tão extensa que Paulo Vannuchi, hoje
secretário de Direitos Humanos, chegou a escrever utilíssimo manual que
mapeia e lista todos os grupos partidários da esquerda clandestina,
indicando a origem de cada um como fragmento de outro. Sem passar pela
aglutinação de ao menos parte dessa esquerda fragmentária, Lula nunca
teria conseguido a legitimidade propriamente política que o tornaria a
personagem que é.
Assim como Golbery, Lula também
compreendeu que a Igreja Católica estava dividida em consequência das
inovações do Concílio Vaticano II e que nela havia uma importante
facção, que ia de leigos a bispos, ansiosa por aliar-se às esquerdas com
base no capital político das comunidades eclesiais de base. A Igreja
tinha seus motivos, temerosa de ver-se repudiada por ponderáveis
parcelas da população, vitimadas por notórias carências sociais. A
primeira manifestação da Igreja em favor da reforma agrária fora em 1950
e viera de um bispo conservador da diocese de Campanha (MG), dom
Inocêncio Engelke, que alude em sua carta pastoral ao risco de que o
êxodo de trabalhadores rurais para a cidade os colocasse à mercê do
proselitismo comunista. É evidente que essa Igreja também compreendeu
que Lula era um personagem politicamente à deriva ao qual poderia
aliar-se, como se aliou.
Operário qualificado e bem pago de
multinacional, Lula compreendia que o sindicalismo da era Vargas se
tornava obsoleto e agonizava, impróprio para a nova militância do
entendimento e da mesa de negociação. O sindicalismo lulista era apenas o
instrumento da nova realidade das relações laborais, divorciadas da
concepção de classes sociais, tendente ao fortalecimento das categorias
profissionais e setoriais. Longe, portanto, do mito da greve geral, a
greve política, mais de confronto com o Estado do que com o capital, que
era a estratégia dos comunistas, fortes no ABC operário. Lula e o PT
serão decisivos na demolição da esquerda característica e histórica.
O carisma crescente de Lula, a figura
mítica buscada pelas esquerdas órfãs e pelo catolicismo social, foi
fundamental para o salto de modernização política representado pelo
surgimento do PT (e também pelo PSDB, entre outros partidos), com a
abertura política promovida pela ditadura no marco das concepções de
Golbery. Lula e o PT cresceram, aglutinando o que nem sempre
corretamente se autodefine como esquerda. O manifesto de 2002, pelo qual
o PT realinha suas orientações ideológicas a favor de uma generosa
aliança com o capital e com as multinacionais, bem como com os grupos
políticos de origem oligárquica, representa o cume na construção de
esquerda do partido e o início do processo de sua desconstrução de
direita. Ainda antes das eleições presidenciais daquele ano, Lula,
falando a usineiros de açúcar e fornecedores de cana de Pernambuco e da
Paraíba, fez a crítica do socialismo e lhes prometeu benefícios de
política econômica, o que resultou na imediata adesão de todos a sua
candidatura.
Daí em diante, Lula no poder e o próprio
PT foram descartando pessoas e facções internas à esquerda de sua opção
conservadora. Foram descartando também as organizações que atuam como
movimentos sociais, abandonando ou atenuando programas e projetos.
Inicialmente, para trazer o apoio do latifúndio e do grande capital a
sua pessoa e a seu governo. Depois, para agregar a sua base política o
que de mais representativo há do remanescente oligarquismo brasileiro e
da obsoleta, e não raro corrupta, dominação patrimonial.
O solidário e empolgado abraço de Lula,
com sorrisos, nesses três aliados, emblemáticos senadores da República, é
sobretudo um fraterno e decisivo abraço no retrocesso histórico e nos
reacionários arcaísmos da política brasileira. O general Golbery achou
que se enganara. Não se enganou.